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Fonte: Jornal Novos Rumos, 15 a 21 de julho 1960.
Transcrição: Diego Grossi Pacheco
HTML: Fernando A. S. Araújo,
Março 2007.
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O objetivo, a meta a alcançar numa dada etapa da revolução, e o movimento, a ação política do dia-a-dia, constituem dois aspectos inseparáveis do processo revolucionário. Muitos dos erros cometidos no movimento operário se devem à compreensão unilateral deste problema. Os anarquistas e, em geral, os ultra-esquerdistas viam só o objetivo e desprezavam toda a atividade política; os reformistas e revisionistas se atinham ao movimento e abandonavam a meta final. "O movimento é tudo, o objetivo é nada” – afirmou no início deste século o revisionista Bernstein.
Em certa medida, este unilateralismo tem se verificado também em nosso Partido, ocasionando prejuízos ao movimento revolucionário. Um dos erros cometidos na época do Manifesto de Agosto foi exatamente o de destacar o objetivo e menosprezar a política em curso no país. Tudo era realizado em função da derrubada imediata do poder das classes dominantes, à margem da situação concreta então existente. Esta posição levou-nos à abstenção injustificável no pleito eleitoral de 1950. Com o Programa de 1954, embora este representasse um enorme avanço na orientação do Partido, insistíamos ainda demasiado no objetivo, não apresentando indicações precisas para fazer frente à situação política. Confundíamos, nele, a estratégia com a tática e, por isso, pregávamos a derrubada imediata do governo e sua substituição pelo governo democrático de libertação nacional. Esta grave falha no Programa começamos a compreender na ação prática, razão porque, nas eleições de 1955 e no golpe de 11 de novembro do mesmo ano, tomamos posições que, se não se contrapunham aos objetivos do Programa, negavam, todavia, a tática nele preconizada de derrubada imediata do governo.
Ao adotarmos uma nova orientação, em março de 1958, caímos no extremo oposto. Abandonamos o objetivo, sob o pretexto de inexistência de condições revolucionárias, no momento, e ficamos na política do dia-a-dia, na luta pelas reformas, no gradualismo dos sucessivos governos chamados nacionalistas e revolucionários. Basta dizer que, nas 6.546 linhas das Teses – documento pretendidamente de caráter programático – há, apenas, nove e meia linhas que tratam do poder antiimperialista e antifeudal, dirigido pela classe operária. Este consta pró-forma no título do capítulo VI. As Teses relegam, assim, a plano secundaríssimo tema tão importante. Nelas, o objetivo desta etapa da revolução, em particular a questão do poder, desaparece quase por completo e tudo se reduz à conquista de um governo nos marcos do atual regime.
Incidindo no unilateralismo, tanto uma como a outra posição, a da época do Manifesto de Agosto como a de hoje, são oportunistas. Oportunista de esquerda e oportunista de direita. E o são precisamente por não contribuírem para o avanço do movimento revolucionário no país. A posição de esquerda deixa as massas vagarem ao sabor dos interesses das classes dominantes, pois enquanto as massas não identificarem o verdadeiro caminho, serão arrastadas à política que aquelas classes realizam. Fatos são fatos e estes mostram que é cada vez maior a participação do povo nas eleições. Se o Partido abdica de intervir no processo eleitoral abandona as massas ao engodo dos demagogos e dos políticos reacionários e nada faz para ajudá-las a efetuar sua própria experiência. A posição de direita deixa também as massas sem direção e sem perspectiva, à reboque dos acontecimentos. Concorre para alimentar ilusões, em particular naquelas forças que se apresentam na arena política defendendo reformas sem, contudo, pretender modificar substancialmente o regime.
É óbvio que a linha da Declaração e das Teses, desligada como é dos objetivos revolucionários, não dá qualquer perspectiva ao povo. Quem quer que conviva com as massas, que ausculte suas reações face a situação presente, pode observar que o povo não vê saída para as dificuldades que atravessa. Muitos poucos acreditam que a solução justa se encontra na substituição de alguns ministros do governo atual, na sua transformação de reacionário em nacionalista. No Rio Grande do Sul, temos um espelho da solução que o Partido apresenta. Aqui, segundo a linha das Teses, se pode dizer que já existe um governo nacionalista e democrático. Está no poder um representante do PTB, partido que a linha atual considera de esquerda e um dos aliados mais próximos da frente única. Que deu ou pode dar, no entanto, este governo trabalhista ao povo? Se bem que tivesse encampado a CEERG, reivindicação das massas e de quase todos os partidos políticos locais, nada mais tem feito o sr. Brizola. No início de seu governo ainda usava uma linguagem “veemente” contra o capital estrangeiro e contra as forças do “poder econômico”. Este seu arroubo oratório foi murchando, até quase desaparecer. Sua “resistência” à política do governo federal, que tantos males causa ao Rio Grande, vai cedendo, à medida que consegue obter verbas e ajuda financeira à administração estadual. Agora, na Secretaria da Fazenda, está um conhecido negocista, o sr. Vitor Issler. A carestia da vida é igual ou maior à de outros centros do país. Sendo este Estado sulino produtor, em larga escala, de gêneros alimentícios, o povo gaúcho paga tão caro pelo arroz, pelo feijão, pela banha e pela carne quanto o de outros estados não-produtores destes artigos. Os impostos indiretos que gravam os gêneros de consumo popular foram bastante aumentados, mas o governo manobra e não põe em prática a elevação do tributo sobre a grande propriedade territorial, aprovada pela Assembléia Legislativa há vários meses. Em troca de um empréstimo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), o sr. Brizola procura transformar a Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) em empresa de capital misto, o que significa perigoso retrocesso no campo econômico, abrindo o flanco da empresa a interesses antinacionais. E já se anuncia a entrega do DEAL (Departamento do Abastecimento do Leite) e do Instituto de Carne, autarquias que possibilitavam certo controle no preço destes produtos, à exploração de particulares. Que perspectiva pode ter o povo com semelhante governo? Não penso que se deva “arrasar” o governo do sr. Brizola ou que tenha sido errado apoiá-lo no pleito de 1958. O governo do sr. Brizola apresenta também aspectos positivos. Mas, não é nem pode ser o tipo de governo que o povo necessita. O Partido, com a orientação atual, não lutando por objetivos mais elevados nem defendendo a necessidade da substituição do regime, confunde-se com os Partidos e com a política da burguesia e, mesmo, dos latifundiários. Não abre, não consegue abrir uma justa e clara perspectiva ao povo.
Evidentemente, não se pode separar o objetivo do movimento, os fins pelos quais lutamos, nesta etapa da revolução, da ação prática cotidiana e da política de frente única. Nossa propaganda, além de divulgar os êxitos dos países socialistas e difundir o socialismo, deve incutir na consciência das massas, particularmente, estas duas idéias. Primeira: só se pode lograr a completa independência do país e as transformações radicais indispensáveis ao progresso do Brasil substituindo o regime atual e conquistando um governo antiimperialista e democrático. E, segunda: só se pode substituir o regime e alcançar aquele governo se se forma uma ampla frente democrática e antiimperialista da qual participem os operários, os camponeses, a intelectualidade, a pequena burguesia e a burguesia nacional.
Mas a propaganda e a agitação não bastam. Por isso, assinalando às massas o verdadeiro caminho – o caminho da substituição do regime e da criação de um governo de novo tipo – os comunistas, ao estabelecerem suas tarefas políticas do momento, têm em vista as etapas necessárias do movimento de massas, ligadas ao grau de consciência política e de organização destas massas. Não propõem, assim, a derrubada imediata do governo. Concentram sua atividade na luta para desenvolver o processo de formação da frente única democrática e antiimperialista, através do impulsionamento do movimento de massas e das ações comuns das diversas forças que podem dela participar. Contribuem ativamente para estruturar e ampliar o movimento nacionalista; para desenvolver o movimento democrático e pela paz; para fortalecer a organização e a unidade sindical; para mobilizar amplamente as massas camponesas; para vitalizar o movimento estudantil e cultural. Esforçam-se para elevar o grau de consciência e a combatividade das massas. Tratam, enfim, de acumular forças. Este processo se realiza em estreita ligação com a luta contra as classes e setores reacionários que sustentam a dominação do imperialismo, particularmente, o norte-americano e as sobrevivências feudais, contra a orientação antinacional e antipopular do governo atual.
Ao mesmo tempo, os comunistas, participando da vida política em curso no país, respondem a todas as questões que surjam e que sirvam para educar ou mobilizar as massas. Tomam parte nos pleitos eleitorais, em que pese as restrições em vigor. Não são indiferentes à escolha e à composição dos governos das classes dominantes, pois têm em conta que estes podem apresentar aspectos diferente, favoráveis ou não, à luta que travam as correntes progressistas. Os comunistas apóiam, em certas circunstâncias, políticos e partidos das classes dominantes. Os acordos e compromissos são inevitáveis na luta revolucionária. Mas isto não pode ser feito de modo a comprometer a independência do Partido ou a confundir sua posição com a dos que recebem este apoio, o que, aliás, tem acontecido muitas vezes. Toda esta atuação dos comunistas deve ser realizada em função dos objetivos que o Partido persegue e devem contribuir para esclarecer as massas e para ajudá-las a compreender a necessidade da substituição do regime atual.
Pode-se argüir que esta tática é “limitada” porque não abre a perspectiva imediata do poder. Mas de que poder? Se se trata do poder das classes dominantes, da simples mudança de alguns elementos tidos como reacionários no governo, conservando o mesmo regime, então devemos dizer que tal perspectiva não se justifica e só serviria para enganar as massas. Com isto, ao invés de elevar a combatividade das forças populares e democráticas, estaríamos, apenas, enfraquecendo sua capacidade de ação. Lutando para desenvolver a frente única e para abrir caminho ao ascenso do movimento de massas, os comunistas devem mostrar ao povo a perspectiva da conquista de um governo diferente, por seu conteúdo e sua política, de todos os governos que já teve o Brasil. Cada conquista obtida, cada êxito alcançado na luta comum, devem ser utilizados para reforçar a confiança das massas nas suas próprias forças e para ampliar e consolidar a frente única. Tanto mais esta se reforce, maior será o aguçamento da luta entre as correntes reacionárias e as progressistas, mais próximos estaremos de uma solução para os problemas que afligem nosso povo.
Inclusão | 29/11/2007 |
Última alteração | 10/09/2011 |