Dossier TIMEX:
Contribuição para a Definição de uma Estratégia

5 de Julho de 1974


Fonte: Jornal Combate, nº 2, Portugal.
Originais enviados por : Manoel Nascimento.
Transcrição e HTML:
Fernando A. S. Araújo, Abril 2008.
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Ao analisarmos a luta dos trabalhadores portugueses face à multinacional Timex, criámos um polo de coordenação. Consideramos esse polo o 25 de ABRIL, pois esta data significa o princípio de uma metamorfose num processo histórico com raizes bem vincadas.

A Tímex implantou-se em Portugal, faz em Outubro próximo 4 anos com a denominação TMX Portugal Ltda. A grande atracção para esta multinacional, aliás como para todas as outras, residia na prática de salários de fome, na presença de um regime opressivo que eliminava qualquer possibilidade de instabilidade no seio da classe trabalhadora, etc.

Os trabalhadores da TMX provêm na sua grande maioria das classes mais baixas da sociedade e sentiram inicialmente nesta empresa a garantia de uma estabilidade de emprego que normalmente não encontravam e uma oferta de regalias (miragens de uma falsa realidade) de que não dispunham na maioria dos casos.

Os salários praticados inicialmente rondavam os 1 300$00 e, só no fim do ano passado saltaram de cerca de 1 500$ para 1 700$.

Concretamente o reconhecimento de uma situação de exploração por parte dos trabalhadores e o princípio da instabilidade começou em fins do ano passado. Muito contribuíram para isso com a sua acção repressiva, pessoas como os 6 individuos que foram saneados. Foi mais precisamente em Novembro que se esboçou a primeira greve que não se concretizou porque o movimento foi desceberto e alguns cabeças foram para a rua. Mas já assim não aconteceu em Fevereiro, quando os trabalhadores depois de terem recebido em média 200$00 de aumento, migalhas para pobres, verificaram que o aumento do custo de vida os tornava ainda mais pobres.

A greve de Fevereiro durou um dia e meio e era essencialmente de carácter económico. Com essa greve os trabalhadores conseguiram 800$00 de aumento para todos independentemente da sua categoria profissional, embora não fosse concretamente o que desejavam.

Esta pequena vitoria deve-se essencialmente à unidade espontânea de toda a classe operária, a mais mal paga. Foram estes os expoentes maximos da luta antes do 25 de Abril. Toda a estratégia de actuação da empresa, antes do 25 de Abril, baseou-se na inexistência de orgãos verdadeiramente representativos da classe, no medo por parte da classe trabalhadora de um sistema repressivo a nível governamental, apoiado pela nojenta PIDE/DGS e na constituição de um sistema de chefia interna com elementos totalmente manobráveis pela empresa e facilmente subornáveis.

Quando eclodiu o golpe do Movimento das Forças Armadas, todo o sistema Imperialista se calou e o povo pensou ter chegado a sua hora e trouxe ao de cima a verdadeira face de uma luta muito mais viva, mas a falta de uma organisacão da dasse e a sua despolitizacão processada durante 48 anos muito têm contribuído para que todo o poder ainda se encontre na mão de uma burguesia capitalista substancialmente apoiada por alguns partidos, que traíram completamente a imagem deles criada.

Após 2 meses de implantação de uma Democracia Burguesa, já está bem definida toda uma estratégia de actuação Imperialista, do Capital e seus monopólios.

A meu ver toda ela se desenvolveu da seguinte maneira:

Inicialmente procurou-se suster toda a frente de luta, continuando a manter o poder económico através das mais variadas organizações existentes que sempre estiveram voltadas para o cume e nunca para a base. Procurou-se os mais variados tipos de acordo por forma a amolecer o ímpeto da dasse e a permitir a organização de um sistema dentro da tal Democracia Burguesa com o fim de evitar o colapso do capital e servi-lo. Para tal muito tem contribuído o lançamento de papões tais como o caos económico — o desemprego — a reacção etc...

O caos económico já era uma realidade e os outros papões tornam-se reais se os trabalhadores ficarem inactivos e não continuarem a organizar-se, a demasca-rar todas as manobras atentatórias e a desenvolver o espirito de unidade.

Os trabalhadores da TMX ao enfrentarem uma das maiores situações de greve, senão a maior, estão também neste momento a enfrentar o desenvolvimento mais avançado da reacção. Ela começou da seguinte forma:

1.° A tentativa de um pequeno grupo minoritário para desacreditar os representantes dos trabalhadores, partindo do sector administrativo.

2.° O impasse criado pela Administração que originou o tão longo período de greve acompanhado com a saída de comunicados ameaçando o não pagamento do ordenado durante este período o que mais tarde se confirmou.

3° A propagação de boatos de falência da empresa e da falsa realidade da situação.

4.º As pressões dos familiares dos operários, na sua maioria bastante jovens (80% do pessoal feminino tem uma idade média de cerca de 18 anos) e de grupos mal identificados que, armados em bons samaritanos, mas que da luta nada conheciam, procuravam convencer as pessoas a aceitar a contra-proposta.

5.º Uma contra-proposta salarial muito bem engendrada dando 2000$00 de aumento muito tentador aos mais mal pagos e não aumentando os que estavam com mais de 7 500$00 desinteressando-os automaticamente.

6.º O perigo que as pessoas sentiram da desgraça económica no seio familiar com o não pagamento dos dias de greve.

7.º O afastamento dos órgãos representativos existentes que mais os poderiam ajudar (é excepção o Sindicato Livre dos Ourives Relojoeiros e Ofícios Correlativos).

Tudo isto levou os trabalhadores a aceitarem no dia 21 em votação secreta a Proposta final da Administração.

Mas a luta não acabou e é agora que surge o verdadeiro perigo que vou expor nos seguintes pontos:

1.º Com o regresso ao trabalho houve um afrouxamento do ímpeto da luta.

2.º Elementos dificilmente detectáveis e aproveitando-se da inexperiência inicial dos trabalhadores, que originou algumas falhas, movem uma campanha de mentalização entre a classe, tendente a desacreditar a comissão.

3.º A tentativa constante de alterar os pontos acordados e de não facilitar o trabalho da comissão, impedindo uma completa autonomia de acção, de forma a não ser possível levar para a frente os programas, em especial no que se refere a gestão de pessoal, que caso não se cumpra, automaticamente demonstra uma incapacidade dos seus representantes, desacreditando-os.

QUAL O FIM EM VISTA?

Levar os trabalhadores por sua própria mão a fazer o saneamento da Comissão.

Cada sector, conforme o grau de mentalização que lhe vai sendo administrado, irá substituir os seus representantes, que comprovadamente se tem sacrificado na luta pelos direitos e interesses da classe, nomeando aqueles que durante a campanha de mentalização mais se tem evidenciado e assim de uma forma progressiva (um de cada vez) e sem que a própria classe se aperceba, a comissão inicial estará completamente substituída por outra comissão que previamente já foi bem ensinada.

Possivelmente a seguir a isto, os representantes iniciais já desacreditados perante a classe serão despedidos ou ser-lhes-à imposto o pedido de demissão.

Para finalizar resta-me lembrar que sou um trabalhador como todos nós e que ao escrever este artigo não pretendo ter dotes de intelectual, mas sim tentar alertar toda a classe para os perigos futuros que vai correr.

Por este motivo faço os seguintes apelos:

— NAO PERMITAMOS DESPEDIMENTOS. UNAMO-NOS CONTRA ELES.

— FOMENTEMOS A UNIÃO DE CLASSE.

— APOIEMOS AQUELES QUE NA REALIDADE DEFENDERAM E DEFENDEM OS NOSSOS INTERESSES, SABENDO SEPARAR 0 TRIGO DO JOIO.

— O POVO UNIDO VENCERA!

Um trabalhador da TMX

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