Intervenções na Conferência Para a Convocação do Congresso Constituinte da República Soviética Tártaro-Bachkíria[N17]

J. V. Stálin

10 a 16 de Maio de 1918


Primeira Edição: "Pravda" ("A Verdade"), nº." 96 e 101, 18 e 24 de maio de 1918.
Fonte: J.V. Stálin – Obras – 4º vol., Editorial Vitória, 1954 – traduzida da edição italiana da Obras Completas de Stálin publicada pela Edizioni Rinascita, Roma, 1949.
Tradução: Editorial Vitória
Transcrição: Partido Comunista Revolucionário
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Fernando A. S. Araújo, setembro 2006.
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1. Discurso de Abertura
(10 de maio)

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Camaradas, esta Conferência foi convocada por iniciativa do Comissariado para os Negócios das Nacionalidades, de acordo com o Conselho dos Comissários do Povo, representado por seu presidente.

O objetivo da Conferência é a formação de uma comissão à qual será confiada a tarefa de convocar o Congresso Constituinte dos Soviets da região em questão. O futuro Congresso terá o objetivo de determinar as fronteiras e o caráter da autonomia tártaro-bachkíria. A idéia da autonomia procede da própria natureza da Revolução de Outubro, que deu a liberdade às nacionalidades. A declaração dos direitos dos povos da Rússia, feita pelo Conselho dos Comissários do Povo nas jornadas de Outubro, e a conhecida resolução do III Congresso dos Soviets que declarou a Rússia uma federação de regiões autônomas, que se distinguem por particularidades de costumes e pela composição étnica, são apenas a expressão formal da essência da Revolução de Outubro.

O III Congresso dos Soviets formulou as teses gerais para a Constituição da República Soviética, convidando as massas trabalhadoras dos povos da Rússia a declararem que formas políticas concretas desejam adotar em suas regiões e que relações desejam manter com o centro. Dentre todas as regiões, ao que parece, apenas a Finlândia e a Ucrânia se pronunciaram de maneira precisa. . . declarando-se pela independência. O Conselho dos Comissários do Povo, depois de se ter convencido de que não somente a burguesia desses países, mas também os elementos proletários aspiravam à independência, sem dificuldade concedeu-lhes (a esses países) o que haviam pedido.

No que se refere às outras regiões, os elementos trabalhadores mostraram-se de um certo modo inertes com relação aos problemas do movimento nacional. No entanto, quanto mais estes se mostravam inertes, tanto mais ativa se mostrava a burguesia. Quase que por toda a parte se constituíram grupos autonomistas burgueses, que organizaram "soviets nacionais", dividiram suas regiões em cúrias nacionais distintas, com regimentos nacionais, orçamentos nacionais, etc., transformando assim os seus países numa arena de lutas nacionais e de chauvinismo. Esses grupos autonomistas (refiro-me aos "soviets nacionais" tártaros, bachkírios, quirguizes, georgianos, armênios, etc.), todos esses "soviets nacionais" queriam unicamente uma coisa: obter a autonomia a fim de que o Poder central não se intrometesse em seus assuntos internos, não os controlasse. "

Concedei-nos a autonomia e nós reconheceremos o Poder Soviético central, mas não podemos reconhecer os soviets locais; estes não devem interferir em nossos assuntos; nós nos organizaremos como quisermos, como soubermos, com os nossos operários e nossos camponeses agiremos como nos aprouver."

Essa é a autonomia burguesa em sua essência, desejada pelos burgueses, que exigem o Poder em toda a sua plenitude para exercê-lo sob a capa da autonomia, contra os "seus" trabalhadores.

É óbvio que o Poder Soviético não pode sancionar semelhante autonomia. Dar a autonomia para que através desta todo o Poder pertença à burguesia nacional, a qual exige que os soviets não se intrometam em seus negócios, abandonar os trabalhadores tártaros, bachkírios, georgianos, quirguizes, armênios, etc., à mercê dos burgueses tártaros, georgianos, armênios, etc., não, isto o Poder Soviético não pode fazer.

A autonomia é uma fórmula. Todo o problema consiste no conteúdo de classe que se introduza nessa fórmula. O Poder Soviético não é em absoluto contrário à autonomia; é favorável à autonomia, mas a uma autonomia na qual todo o Poder se encontre nas mãos dos operários e dos camponeses, na qual os burgueses de todas as nacionalidades sejam não só afastados do Poder, como nem sequer participem nas eleições dos órgãos do governo.

Essa será exatamente a autonomia baseada nos princípios soviéticos.

Há dois tipos de autonomia. O primeiro é representado pela autonomia puramente nacionalística. Essa autonomia é baseada no princípio da extraterritorialidade, nos princípios do nacionalismo. "Soviets nacionais", regimentos nacionais em torno desses soviets, populações divididas em cúrias nacionais, lutas nacionais inevitáveis, tais são os resultados desse tipo de autonomia. Tal tipo de autonomia leva inevitavelmente à morte dos soviets dos deputados operários e camponeses. Esse é o tipo de autonomia a que a Rada burguesa aspirava. É natural que para se reforçar e desenvolver, a Rada tenha sido obrigada a combater contra os soviets de operários e camponeses. Na Transcaucásia, a existência de soviets nacionais armênios, georgianos e tártaros levou, ao mesmo resultado. Gueguetchkori tinha razão quando perguntava aos soviets dos deputados e ao Comissariado da Transcaucásia:

"Não sabeis acaso que o Comissariado e os soviets dos deputados tornaram-se coisa fictícia, visto como todo o Poder passou de fato às mãos dos soviets nacionais, que dispõem dos seus próprios regimentos nacionais?"

Esse tipo de autonomia nós o repelimos por princípio.

Nós propomos um outro tipo de autonomia, o tipo de autonomia das regiões onde predominam uma ou mais nacionalidades. Nada de cúrias nacionais, nenhuma separação nacional: a autonomia deve ser soviética, baseada nos soviets de deputados. Isto quer dizer que em deter-minada região os homens devem ser divididos não segundo um critério nacional, mas segundo um critério de classe. Soviets dos deputados de classe como base da autonomia, autonomia como forma em que se exprime a vontade desses soviets dos deputados, tal é o caráter da autonomia soviética que nós propomos.

O mundo burguês elaborou uma determinada forma de relações entre as regiões autônomas e o centro. Refiro-me à América do Norte, ao Canadá e à Suíça. Naqueles países o Poder central compõe-se de um parlamento para todo o Estado, eleito por toda a população dos estados (ou dos cantões) e de um conselho federal, eleito paralelamente pelos governos dos estados (ou dos cantões). Cria-se desse modo um sistema bicameral com o seu burocratismo legislativo e com a sufocação de qualquer atividade revolucionária.

Somos contrários a semelhante sistema de edificação do Poder em nosso país. Somos contrários não apenas porque o socialismo repele resolutamente um tal sistema bicameral, mas também em face de considerações práticas sugeridas pelo momento atual. O fato é que no presente momento de transição, no qual a burguesia foi batida mas ainda não esmagada, no qual a ruína econômica e alimentar, agravada pelas insídias da burguesia, ainda não foi liquidada; no qual o velho mundo capitalista foi destruído e o novo mundo socialista ainda não foi completamente construído, neste momento o país tem necessidade de um Poder forte, para toda a Rússia, e capaz de esmagar definitivamente os inimigos do socialismo e de organizar uma economia nova, comunista. Em suma, precisamos do que é de uso chamar-se ditadura do proletariado das cidades e do campo. Criar neste momento, paralelamente ao Poder central, órgãos soberanos locais, significaria na realidade determinar a derrocada de todo poder e um retorno ao capitalismo. Exatamente por isso é necessário deixar ao Poder central todas as funções que tenham importância para todo o país e atribuir aos órgãos regionais principalmente funções administrativas, políticas e culturais, de caráter puramente regional. Essas funções são: a escola, os tribunais, a administração, as necessárias medidas políticas, as formas e os modos de pôr em prática os decretos gerais de conformidade com as condições e os usos nacionais, e todas essas funções devem desenvolver-se através da língua materna, acessível à população. Eis por que o tipo de união regional geralmente reconhecido, dirigido por um Comitê Executivo Central Regional, é a forma realmente mais racional de tal autonomia.

Esse é o tipo de autonomia, cuja necessidade no presente momento de transição se impõe no interesse não só do fortalecimento da ditadura do proletariado, como também da luta comum dos proletários de todas as nações da Rússia contra o nacionalismo burguês, último baluarte do imperialismo.

Tudo isso fixa de maneira bastante clara as tarefas de nossa Conferência. A Conferência ouvirá os informes dos delegados das várias localidades para ter diante de si um quadro geral das reivindicações das massas trabalhadoras das nacionalidades da região. Além disso, traçará um esquema geral preliminar do território no qual o povo trabalhador será convidado a eleger o Congresso Constituinte dos Soviets da Região, eleições nas quais o direito de voto será concedido não apenas às massas trabalhadoras organizadas nos soviets do território autônomo, mas também àquelas das zonas limítrofes. Enfim, a Conferência elegerá uma comissão à qual será confiada a tarefa de convocar o Congresso Constituinte dos Soviets da Região. A solução da questão da autonomia, a determinação das competências da autonomia e a fixação definitiva dos limites da Região serão confiadas ao Congresso Constituinte.

Tais são as tarefas da presente Conferência.

Declaro aberta a Conferência e permito-me exprimir a certeza de que a Conferência estará à altura das tarefas que se lhe deparam.

2. Discurso de Encerramento
(16 de maio)

Permiti-me declarar-vos, em nome do Poder Soviético central, que o Conselho dos Comissários do Povo sempre considerou e continua a considerar seu sacrossanto dever ir ao encontro do movimento de libertação das massas oprimidas e exploradas dos povos do Oriente, e, antes de mais nada, do misérrimo Oriente muçulmano. Todo o caráter da nossa revolução, a própria natureza do Poder Soviético, toda a situação internacional e, enfim, até mesmo a posição geográfica da Rússia, colocada entre a Europa imperialista e a Ásia oprimida, tudo isso impõe indubitavelmente ao Poder Soviético uma política de apoio fraternal aos povos oprimidos do Oriente em sua luta de libertação.

De todas as formas de opressão hoje existentes, a mais sutil e perigosa é a opressão nacional. Ela é sutil pelo fato de que serve para cobrir comodamente a fisionomia rapace da burguesia. É perigosa pelo fato de que, fomentando os conflitos nacionais, desvia habilmente da burguesia a tempestade. Se os saqueadores europeus conseguem jogar os operários uns contra os outros nas carnificinas mundiais, se além disso ainda conseguem alimentar essa carnificina, isso entre outras coisas acontece porque a força do nacionalismo burguês, que ofuscou a mente dos operários europeus, ainda não se esgotou. O nacionalismo é a última posição da qual é necessário desalojar a burguesia para vencê-la completamente. Mas descurar a questão nacional, ignorá-la e negá-la, como fazem alguns camaradas nossos, ainda não significa derrotar o nacionalismo. Absolutamente não! O niilismo nacional não faz senão prejudicar a causa do socialismo, porque faz o jogo dos nacionalistas burgueses. Para derrotar o nacionalismo é necessário antes de mais nada colocar e resolver a questão nacional. Mas para resolver a questão nacional abertamente e segundo os princípios socialistas, é necessário conduzi-la pela estrada soviética, submetendo-a em tudo e por tudo aos interesses das massas trabalhadoras organizadas nos soviets. Assim, e só assim, é possível arrancar à burguesia a sua última arma moral. A República Autônoma dos tártaros-bachkírios hoje criada é a solução prática desse problema geral e importante para toda a nossa revolução. Possa essa República Autônoma ser um vivo farol para os povos do Oriente muçulmano, farol que ilumine o caminho da libertação da escravidão!

Permiti-me declarar encerrada a Conferência para a convocação do Congresso Constituinte dos Soviets da República Tártaro-Bachkíria e augurar-vos completo êxito na obra de organização de vossa República Autônoma.


Notas de fim de tomo:

[N17] A Conferência para a convocação do Congresso Constituinte da República Federativa Tártaro-Bachkíria verificou-se em Moscou, de 10 a 16 de maio de 1918, e foi presidida por Stálin. Dela participaram representantes dos tártaros, dos bachkírios, dos tchuvachos e dos maríos. Foi eleita a comissão encarregada de convocar o Congresso Constituinte dos Soviets, que não se realizou, porém, por causa da guerra civil iniciada nesse ínterim. (retornar ao texto)

pcr
Inclusão 13/01/2008