Lula: do Operariado à Direção Nacional

Jorge Enea Spilimbergo

Dezembro de 2002


Primeira Edição: Edição de dezembro de 2002 do periódico Patria y Pueblo.
Transcrição: Néstor Miguel Gorojovsky.
Tradução para o português: Gabriel Zerbetto Vera
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Fernando A. S. Araújo, setembro 2007.
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O ano de 2003 brilha com a ascensão de Lula da Silva como presidente constitucional da república-irmã do Brasil. O fato histórico conflui com outros resultados, como a ascensão de Evo Morales na Bolívia, o triunfo de Lucio Gutiérrez no Equador e a derrota do oficialismo no Peru pelas mãos de um quem sabe renascido APRA, sem nos esquecermos da iminência de uma vitória próxima da Frente Grande no Uruguai.

Ao mesmo tempo endurece o enfrentamento entre o governo popular de Chávez na Venezuela e o golpismo da pequena-burguesia de Caracas, saudosa do turismo de compras a Miami, com o auspício da ala petroleira da CIA.

Em seguida, a estupidez midiática se pôs a perguntar quem poderia ser o Lula argentino. A ascensão de Lula reflete o crescimento industrial de São Paulo, a emergência de um proletariado jovem e vigoroso que encontrou no metalúrgico Lula um líder cabal. A comparação possível é com os trabalhadores argentinos de 1945.

Hoje, em contraste, a catástrofe industrial perpetrada pela ditadura e seus sucessores civis (de Alfonsín a Duhalde, passando por Menem, Cavallo, De La Rúa) marca outras vias de convergência a uma aliança estratégica.

Da raiz proletária de Lula se erigiu o Partido dos Trabalhadores, cujo primeiro impulso trabalhista marcou sua força e seus limites temporais. Três eleições presidenciais e três derrotas balizaram esta marcha firme e obstinada. Alguma vez, ao analisar esta pré-história, soubemos criticar tendências “social-democratas” do PT, por exemplo, sua oposição ao programa nuclear, ao submarino atômico, etc., à sombra (suspeitávamos) de um certo pacifismo esquerdóide europeu-ocidental.

Mas Lula não se ateve a esses esquemas e logo compreendeu que, nesse gigante semi-colonial que é o Brasil, é preciso assumir a raiz desatadora do conflito que é o antagonismo entre o império e o corpo nacional asfixiado pela dependência. Ele explica sua laboriosa política de alianças com setores médios e empresariais, assim como seu diálogo com um estamento militar que até ontem se caracterizava pelas máculas do anticomunismo e do conflito com a Argentina.

Foi um caminho convergente, incitado pelo avance do imperialismo ianque sobre a portentosa reserva que significa a Amazônia (patrimônio da humanidade ianque, pensa Bush), não muito distinto que a voracidade sobre a Patagônia, a Antártida e os oceanos meridionais.

Mudou assim o eixo da hipótese de conflito, projetando-se para a defesa Amazônia e descongestionando militarmente a fronteira sul com a Argentina, Uruguai e Paraguai. Há poucos meses, o Estado Maior brasileiro desconsiderou nossos países como hipóteses de conflito e, passando aos feitos, transladou suas fortes dotações meridionais a destinos mais adequados.

Por estas e outras, as confluências geradas pelo conflito central com o Império foram esboçando o projeto de uma frente nacional onde os trabalhadores têm uma presença vigorosa, mas não fechada ou sectária. Causou surpresa nos meios acadêmicos a repercussão da mensagem de Lula aos quadros militares, recebida por aqueles com entusiasmo quase efusivo.

Este processo de crescimento e maturação foi interpretado por setores da esquerda “entreguista” (ou todos) como uma “entrega” de Lula, sua “traição” anunciada. Não vemos dessa forma, mais além dos avatares da luta contra o inimigo implacável.


Inclusão 16/09/2007