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"Marx não fez do capital a idéia comumente admitida em economia política, segundo a qual o capital é um conjunto de meios de produção, sendo ele próprio um produto; Marx procura expressar uma idéia histórico-dialética, penetrando no jogo de metamorfoses dos conceitos e da história.
O capital, diz ele, nasce da moeda; constitui uma fase histórica que começou no século XVI, com os rudimentos de mercado mundial que a época admitia. Evidentemente, o rigor da análise econômica perde-se em face de tal conceito. Nesse gênero de concepções... julgadas meio-históricas e meio-lógicas, mas, no fundo, unicamente produtos bastardos da fantasia histórica e lógica, a faculdade de distinção e de compreensão põe abaixo toda probidade no uso dos conceitos" - e assim continua por toda uma página, numa verdadeira carga de cavalaria."....A definição marxista do conceito do capital só pode introduzir a confusão na rigorosa teoria econômica... improvisações que pretendem impor-se como verdades lógicas profundas... fragilidade de fundamentos", etc.
Assim, segundo Marx, o capital teria nascido da moeda no começo do século XVI. É como se disséssemos que a moeda metálica nasceu há três mil anos, do gado, porque, como se sabe, este teve antigamente função de moeda. Só mesmo o Senhor Dühring seria capaz de exprimir-se com tanta grosseria e desacerto. Na análise que faz Marx das formas econômicas no seio das quais se opera o processo de circulação das mercadorias, a moeda aparece como a forma última e superior."Este produto último da circulação das mercadorias é a primeira forma sob a qual se manifesta o capital. Do ponto de vista histórico, o capital ergue-se por toda Parte contra a propriedade territorial, sob a forma de dinheiro, como numerário, como capital mercantil e capital usurário... O mesmo fenômeno desenvolve-se diariamente aos nossos olhos. Na sua primeira entrada em cena, isto é, na sua primeira aparição no mercado, quer se trate do mercado de mercadorias, do de trabalho ou de moeda, o capital reveste sempre a forma dinheiro, a forma de um dinheiro que, por processos determinados, deve transformar-se em capital". (O Capital, livro I, capítulo IV). É, portanto, um fato que Marx registra. Incapaz de contestá-lo, o Senhor Dühring deforma-o; o capital teria nascido da moeda.
Marx prossegue, então, no estudo dos processos pelos quais a moeda se transforma em capital; verifica, inicialmente, que a forma sob a qual a moeda circula como capital é a inversão exata da forma sob a qual ela circula como equivalente geral das mercadorias. O simples possuidor de mercadorias vende para comprar; vende aquilo de que não tem necessidade e, com o dinheiro obtido, compra aquilo de que tem necessidade. O capitalista incipiente começa por comprar aquilo de que ele próprio"não tem" necessidade; compra para vender, e para vender mais caro, para recuperar o valor dinheiro primitivamente aplicado na compra e, mais ainda, para recuperá-lo acrescido de um excedente em dinheiro, que Marx denomina de mais-valia.
Qual a origem dessa mais-valia? Ela não pode provir nem de ter o comprador comprado as mercadorias abaixo de seu valor, nem de tê-las vendido acima de seu valor. Com efeito, nesses dois casos, os ganhos e as perdas de cada um se compensam reciprocamente, porquanto cada um é sucessivamente comprador e vendedor. Ela não pode igualmente provir do dolo, porque este pode muito bem enriquecer um a expensas de outro, mas não aumentar a soma total possuída por um e por outro, nem, por conseguinte, a soma dos valores em circulação num país. É difícil que a totalidade da classe capitalista de um país se engane a si própria". (O Capital, pág. 165).
E, entretanto, verificamos que a classe dos capitalistas de cada país, tomada em seu conjunto, se enriquece constantemente aos nossos olhos, vendendo mais caro do que comprou, apropriando-se da mais-valia. Estamos, porém, tão adiantados como no começo; donde provém a mais-valia? É esta questão que se trata de resolver e de maneira "puramente econômica" abstração feita de qualquer dolo, de qualquer intervenção de poderes estranhos. O problema é este: como é possível vender constantemente mais caro do que se comprou, mesmo que se suponha que se trocam sempre valores iguais por valores iguais?
A solução dessa questão é, na obra de Marx, o seu grande mérito, um acontecimento que marca uma época. Ela veio iluminar domínios econômicos em que até aqui não só os socialistas como os economistas burgueses tateavam no meio das trevas mais espessas. Data dessa época, e em torno dela se agrupa, o socialismo científico.
A solução é a seguinte. O aumento do valor da moeda que se vai transformar em capital não poderia operar-se sobre essa "moeda", nem provir da"compra", porquanto essa moeda realiza aqui somente o preço da mercadoria, e esse preço - pressupondo-se, como se pressupõe, que os valores trocados são iguais - não é diferente do valor. Por essa razão, também o acréscimo do valor não pode provir de "venda" da mercadoria. É preciso, portanto, que essa alteração se verifique na mercadoria comprada e não em seu"valor", visto ser ela comprada e vendida por seu valor, mas por seu"valor de uso" como tal; dito de outro modo: a mudança de valor deve resultar do consumo da mercadoria. "Para inferior, porém, o valor do consumo de uma mercadoria, seria preciso que o nosso possuidor de dinheiro tivesse a sorte de descobrir na esfera da circulação, isto é, no mercado, uma mercadoria cujo valor de uso fosse dotado da singular propriedade de ser fonte de um novo valor ou cuja utilização real seria, pois, a materialização do trabalho e, por conseqüência,"criação de valor". Ora, o possuidor de dinheiro encontra no mercado essa mercadoria particular: é a capacidade de trabalho, ou"força de trabalho". (O Capital, página 190). Se, conforme vimos, o"trabalho" como tal não pode ter um valor, não é esse, de maneira alguma, o caso da"força de trabalho". Esta recebe um valor desde que se torna"mercadoria", como o é hoje, de fato; e esse valor é determinado,"como o de qualquer mercadoria, pelo tempo de trabalho necessário à produção, incluindo-se nela, por conseguinte, a reprodução desse trabalho específico"; isto é, pelo tempo de trabalho necessário para criar os meios de existência dos quais o trabalhador necessita para se manter apto para o trabalho e para continuar procriando trabalhadores. Admitamos que esses meios de existência representem, em média, um tempo de trabalho de seis horas por dia, nosso capitalista incipiente, que compra"força de trabalho" para impulsionar o seu negócio, isto é, que aluga um trabalhador, paga a esse trabalhador o valor diário completo de sua força de trabalho, pois que lhe dá uma soma em dinheiro que representa igualmente seis horas de trabalho. E, desde que o operário trabalhe seis horas ao serviço do capitalista incipiente terá reembolsado inteiramente este último da quantia que lhe foi paga, isto é, do valor diário de força de trabalho que o capitalista lhe pagou. Mas, dessa maneira o dinheiro não seria transformado em capital, não teria engendrado mais-valia. Também o comprador da força de trabalho tem, em conseqüência, uma maneira inteiramente diversa de encarar a natureza do contrato realizado com o operário. O fato de somente seis horas de trabalho serem necessárias para manter a vida do trabalhador durante vinte e quatro horas, não o impede de modo algum que seja obrigado a trabalhar doze horas em vinte e quatro. O valor da força de trabalho e a sua exploração no processo de trabalho são duas grandezas distintas. O possuidor de dinheiro pagou o valor da força de trabalho; ele é, portanto, proprietário dela durante todo o dia, fazendo trabalhar o dia inteiro o mesmo operário. Que valor criado pela utilização dessa força de trabalho, durante um dia, seja duas vezes tão grande quanto o valor diário dessa força, é uma grande sorte para o comprador; mas não é, de forma alguma, de acordo com as leis que regem a troca de mercadorias, uma injustiça em relação ao vendedor. Assim, o trabalho custa ao possuidor de dinheiro, segundo a nossa hipótese, diariamente, o produto em valor de seis horas de trabalho. Diferença em proveito do possuidor de dinheiro; seis horas de sobre-trabalho não pago, no qual se acha incorporado o trabalho de seis horas. Realizou-se o milagre, a mais-valia foi produzida, o dinheiro transformou-se em capital.
Demonstrando, assim, como nasce a mais-valia e a única maneira pela qual a mais-valia pode nascer, sob o império das leis que regem a troca das mercadorias, Marx pôs a nu o mecanismo do atual regime capitalista de produção e do regime de apropriação fundado sobre ele, desvendando o núcleo central em torno do qual gira toda a ordem social atual.
Essa gênese do capital tem, entretanto, uma condição prévia essencial:"A transformação do dinheiro em capital exige que o possuidor de dinheiro encontre no mercado o"trabalhador livre', e livre sob um duplo sentido. É preciso, primeiramente, que o trabalhador possa dispor, como pessoa livre, de sua força de trabalho, como de uma mercadoria qualquer; é preciso, em seguida, que não tenha outra mercadoria a vender e que esteja livre e desembaraçado de todas as coisas necessárias para realizar, por conta própria, a sua força de trabalho". (O Capital, página 192). Mas essa relação entre possuidores de dinheiro e de mercadorias, homens que nada possuem senão sua própria força de trabalho, por outro lado, não é uma relação dependente da natureza, nem muito menos um fato comum a todos os períodos da História:"é evidentemente o resultado de um desenvolvimento histórico anterior, o produto... do desaparecimento de toda uma série de formas antigas de produção social". Com efeito, esse trabalho livre aparece na história, pela primeira vez, em massa, no fim do século XV e começo do XVI, em seguida à decomposição do regime feudal de produção. Ora, por isso mesmo e pela criação, que data da mesma época, do comércio mundial e do mercado mundial, são lançadas as bases sobre as quais a massa da riqueza mobiliária existente vai-se convertendo progressivamente em capital e o modo capitalista de produção vai-se inclinando inteiramente para a criação de mais-valia, vai se transformando, por força das circunstâncias, no sistema predominante e exclusivo.
Até aqui, temos acompanhado as"concepções exóticas" de Marx, esses"produtos bastardos da fantasia histórica e lógica", em que"a faculdade de discernimento da inteligência com tudo o que significa probidade no uso dos conceitos". Oponhamos, agora, a essas"improvisações" as"profundas verdades lógicas" e o "caráter científico definitivo e rigoroso no sentido das disciplinas exatas", tais como nos oferece o Senhor Dühring.
Já vimos que Marx não tem do capital"a idéia comumente admitida em economia política, segundo a qual é um conjunto de meios de produção que são, ao mesmo tempo, produtos; em vez disso, ele diz que uma soma de valores não se transforma em capital senão quando se valoriza, isto é, quando cria mais-valia. E que diz o Sr. Dühring?"O capital é a base dos meios econômicos que permitem a continuidade da produção e a obtenção geral de lucros sobre os resultados da força de trabalho geral". Por mais oracular e ofuscante que seja o seu modo de expressar-se, é evidente que, segundo a própria declaração do Senhor Dühring, essa"base de meios econômicos", embora impulsione a produção até a eternidade, não se converterá em capital enquanto não proporcionar"lucros sobre o resultado da força geral de trabalho", isto é, mais-valia ou, pelo menos, sobre-produto. Assim, o pecado que o Senhor Dühring acusa em Marx, de não fazer do capital a idéia comumente admitida em economia política, não somente ele próprio o comete, como perpetra, em relação a Marx, um plágio torpe, "mal dissimulado" por meio de frases pretensiosas.
A página 262, essa idéia recebe um novo desenvolvimento:"O capital no sentido social (e o capital num sentido não social é outra coisa que o Senhor Dühring terá ainda que descobrir) é especificamente distinto dos simples meios de produção; porque, enquanto estes últimos não têm senão um caráter técnico e são indispensáveis em todas as circunstâncias, o capital se distingue pela sua força social de apropriação e de participação. O capital social é, na verdade, em grande Parte, apenas o meio técnico de produção em sua função social, mas é precisamente essa função que... deve desaparecer". Se nos lembrarmos que foi Marx, precisamente, quem primeiro salientou a"função social" graças à qual só uma soma de valor se torna capital, fatalmente,"todo observador atento terá que compreender logo que a definição marxista de capital só pode estabelecer confusão - não como pensa o Senhor Dühring, na rigorosa teoria econômica, mas única e exclusivamente na cabeça do Sr. Dühring, que, na História crítica, Se esquece da atração que exercia sobre ele, em larga escala; no Curso, a referida idéia de capital.
Entretanto, o Senhor Dühring não se contenta de tomar emprestada a Marx. embora sob uma forma"apurada", sua definição do capital e é obrigado a continuar também no"jogo de metamorfoses dos conceitos e da história", e isso apesar dele mesmo compreender que daí não podem sair senão"imaginações exóticas","improvisação", "fragilidade dos fundamentos" etc. Donde vem essa"função social" do capital que lhe permite apropriar-se dos frutos de trabalho alheio e que, por si só, o distingue do simples meio de produção?"Ela não assenta - diz o Sr. Dühring - na natureza dos meios de produção e em seu indispensável caráter técnico"; ela, portanto, nasceu da História; e o Sr. Dühring limita-se a repetir, à página 252, o que nós o ouvimos dizer dez vezes: explica a origem do capital pela famosa aventura dos dois homens, dos quais um, no começo da história, transforma os seus meios de produção em capital pelo simples fato de submeter o outro ao seu poder. Mas, não contente em assinalar uma origem histórica à função social em virtude da qual uma soma de valor se torna capital, o Senhor Dühring profetiza-lhe também um fim histórico:"É precisamente ela que deve desaparecer". Um fenômeno nascido historicamente, e que historicamente desaparece, chama-se, na linguagem comum,"uma fase histórica". O capital é, pois, uma fase histórica, não somente em Marx como também no Senhor Dühring. Somos, assim, forçados a concluir que estamos entre jesuítas: quando dois homens fazem a mesma coisa, não é a mesma coisa. Quando Marx diz que o capital é uma fase histórica, essa afirmação é resultado de"uma imaginação exótica, produto bastardo da fantasia histórica e lógica em que a faculdade de discernimento desaparece com tudo o que significa probidade no emprego dos conceitos". Quando o Sr. Dühring apresenta igualmente o capital como uma fase histórica, isso é uma prova de "penetração na análise econômica, do caráter científico mais definitivo e mais rigoroso, no sentido das disciplinas exatas".
Em que se distingue, portanto, a idéia que o Sr. Dühring faz do capital da idéia de Marx?"O capital - diz Marx - não inventou o sobre-trabalho. Onde quer que uma Parte da sociedade possua o monopólio dos meios de produção, o operário, seja ele livre ou escravo, é obrigado a acrescentar ao tempo de trabalho necessário à sua própria conservação um tempo de trabalho suplementar para produzir os meios de subsistência de que tem necessidade o proprietário dos meios de produção". (O Capital, livro I, cap. VIII)."O sobre-trabalho, o trabalho excedente ao tempo necessário à manutenção do trabalhador", e a apropriação do produto desse sobre-trabalho por outrem, a exploração do trabalho, são, pois, comuns a todas as formas de sociedade até aqui existentes, enquanto nelas reinarem os antagonismos de classes. Mas é somente quando o produto desse sobre-trabalho se reveste da forma de mais-valia, quando o proprietário dos meios de produção encontra diante de si, como objeto de exploração, o trabalhador livre - livre de entraves sociais e livre de bens próprios - e o explora tendo em vista a produção de mercadorias, é somente, então, segundo Marx, que os meios de produção se revestem do caráter específico de capital. E isso só se produziu em grande escala depois do fim do século XV e começo do século XVI.
Para o Senhor Dühring, ao contrário,"toda soma de meios de produção é capital"que constitui um direito à participação nos frutos da força de trabalho" e que, por conseguinte, tem como resultante o sobre-trabalho qualquer que seja a sua forma.
Noutros termos, o Senhor Dühring apropria-se do conceito de sobre-trabalho descoberto por Marx para fulminar a mais-valia, igualmente descoberta por Marx, e que, por enquanto, não lhe convém. Segundo o Senhor Dühring, não só a riqueza mobiliária e imobiliária dos cidadãos atenienses e corintios, que utilizavam o trabalho escravo, mas também a dos grandes proprietários territoriais romanos da época imperial, e, do mesmo modo, dos barões feudais da Idade Média, por pouco que servissem, de qualquer maneira, à produção, constituem, todas, modalidades, sem exceção, de capital.
O próprio Senhor Dühring faz, portanto, do capital"não a idéia comumente admitida de que é um conjunto de meios de produção, que são, ao mesmo tempo, produtos, mas uma idéia inteiramente oposta, que abrange inclusive os meios de produção não produzidos: a terra e seus recursos naturais. Mas, de resto, essa idéia de que o capital é simplesmente"um conjunto de meios de produção, que são, ao mesmo tempo, produtos", não é"comumente admitida" senão na economia vulgar. Fora dessa economia vulgar tão cara ao Senhor Dühring, o meio de produção, produto ele próprio, ou, de maneira geral, uma soma qualquer de valores, só se torna capital quando produz um lucro ou juros, isto é, quando rende sobre-produto do trabalho não retribuído, sob a forma de mais-valia, apropriando-se, além disso, sob qualquer dessas duas formas ou variantes especificas, do mais-valor. Para nós, é-nos absolutamente indiferente que todos os economistas burgueses se deixem dominar pela idéia de que a virtude de produzir juros ou lucros é inerente a qualquer soma de valores invertidos, sob condições normais, na produção ou na troca de mercadorias. Capital e lucro ou capital e juros são, na economia clássica, inseparáveis, estão de tal maneira entrelaçados entre si como a causa e o efeito, o pai e o filho, o ontem e o hoje. Mas a palavra, capital, na sua significação econômica moderna, só aparece na época em que surge o próprio fenômeno que o caracteriza, em que a riqueza mobiliária se reveste cada vez mais da função de capital, isto é, explora o sobre-trabalho de operários livres, com o fim de produzir mercadorias; e esse fenômeno começa a tomar forma, pela primeira vez, na mais antiga nação capitalista que se apresenta na história: a Itália dos séculos XV e XVI. E quando em primeiro lugar Marx analisou, até às suas raízes, o regime de apropriação característico do capital moderno, quando Marx pôs o conceito de capital de acordo com os fatos históricos de que se havia afastado e aos quais devia a existência; quando Marx libertou, assim, esse conceito econômico das idéias obscuras e flutuantes que lhe eram inerentes, mesmo na economia burguesa clássica, e nos sistemas socialistas anteriores; foi precisamente Marx quem procedeu com aquele"caráter científico mais definitivo e mais rigoroso" que o Senhor Dühring tem sempre à boca e que tanto lamentamos não encontrar nele.
De fato, a coisa passa-se de modo inteiramente diverso com o Senhor Dühring. Não contente com o ter qualificado depreciativamente a concepção do capital, como fase histórica, considerando-o um"produto bastardo da fantasia histórica e lógica", e tê-lo apresentado, logo depois, como uma fase histórica, proclama como capital "todos" os meios de poder econômico,"todos" os meios de produção que"servem para se apropriar de uma Parte dos frutos da força de trabalho geral", compreendendo-se nisso, por conseqüência, a propriedade territorial em todas as sociedades de classe; o que não o impede, de forma alguma, de fazer, em seguida, entre a propriedade territorial e a renda territorial a distinção tradicional entre capital e lucro, para qualificar de capital somente os meios de produção que produzem um lucro ou juros, como se pode ver nas páginas 118 e seguintes do seu Curso. O Senhor Dühring poderia também, sob a denominação de locomotivas, incluir cavalos, bois, asnos e cães, porque os mesmos podem pôr em movimento um veículo, censurando os engenheiros de hoje, que restringem o nome de locomotivas aos modernos transportes a vapor, fazendo disso tudo uma fase histórica e entregando-se a imaginações exóticas, produtos bastardos da fantasia histórica e lógica etc. E terminaria por declarar que cavalos, bois, asnos e cães são excluídos da denominação de locomotivas, que não se aplica senão aos veículos a vapor.
Tudo isso nos obriga a dizer novamente: são exatamente o conceito e a definição de capital, apresentados pelo Sr. Dühring, que carecem de toda"a nitidez de análise da Economia política" e que perderam a"capacidade de distinção e toda a probidade no uso dos conceitos"; as concepções áridas, os confusionismos, as superficialidades que pretendem impor-se como verdades lógicas e profundas, bem como a fragilidade dos fundamentos florescem esplendorosamente nas páginas do próprio Senhor Dühring.
Mas tudo isso não significa grande coisa. Ao Sr. Dühring caberá sempre a glória de haver descoberto o eixo em torno ao qual se moveram, até aqui, toda a economia, toda a política, todo o direito, numa palavra - toda a história. Eis aqui a pedra angular irremovível.
"A violência e o trabalho são os dois fatores capitais que entram em jogo na constituição das relações sociais".
Nessa única proposição está encerrada a constituição inteira do mundo econômico até aos nossos dias. Ela é extremamente breve e está assim concebida:
Artigo 1º: O trabalho produz.
Artigo 2º.: A violência distribui.
E é a isso que se reduz,"falando humanamente e em alemão", toda a ciência económica do Senhor Dühring.
Inclusão | 30/10/2002 |