Salário, Preço e Lucro

Karl Marx


11 - As diversas partes em que se divide a mais-valia


A mais-valia, ou seja aquela parte do valor total da mercadoria em que se incorpora o sobretrabalho, ou trabalho não remunerado, eu chamo lucro. Este lucro não o embolsa na sua totalidade o empregador capitalista. O monopólio do solo permite ao proprietário da terra embolsar uma parte desta mais-valia, sob a denominação de renda territorial, quer o solo seja utilizado na agricultura ou se destine a construir edifícios, ferrovias ou a outro qualquer fim produtivo. Por outro lado, o fato de ser a posse dos meios de trabalho o que possibilita ao empregador capitalista produzir mais-valia, ou, o que é o mesmo, apropriar-se de uma determinada quantidade de trabalho não remunerado, é precisamente o que permite ao proprietário dos meios de trabalho, que os empresta total ou parcialmente ao empregador capitalista, numa palavra, ao capitalista que empresta o dinheiro, reivindicar para si mesmo outra parte desta mais-valia, sob o nome de juro, de modo que ao capitalista empregador, como tal, só lhe sobra o chamado lucro industrial ou comercial.

A questão de saber a que leis está submetida essa divisão da importância total da mais-valia entre as três categorias de pessoas aqui mencionadas, é inteiramente estranha ao nosso tema. Mas, do que deixamos exposto depreende-se, pelo menos o seguinte:

A renda territorial, o juro e o lucro industrial nada mais são que nomes diferentes para exprimir as diferentes partes da mais-valia de uma mercadoria ou do trabalho não remunerado, que nela se materializa, e todos provém por igual desta fonte e só desta fonte. Não provêm do solo, como tal, nem do capital em si; mas o solo e o capital permitem a seus possuidores obterem a sua parte correspondente na mais-valia que o empregador capitalista extorque ao operário. Para o operário mesmo, é uma questão de importância secundária que esta mais-valia, fruto de seu sobretrabalho, ou trabalho não remunerado, seja exclusivamente embolsada pelo empregador capitalista ou que este se veja obrigado a ceder parte a terceiros, com o nome de renda do solo, ou juro. Suponhamos que o empregador utiliza apenas capital próprio e seja ele mesmo o proprietário do solo; neste caso, toda a mais-valia irá parar em seu bolso.

É o empregador capitalista quem extrai diretamente do operário esta mais-valia, seja qual for a parte que, em última análise, possa reservar para si. Por isto, desta relação entre o empregador capitalista e o operário assalariado depende todo o sistema do salariado e todo o regime atual de produção. Alguns dos cidadãos que intervieram em nosso debate, ao intentarem atenuar as proporções das coisas e apresentar esta relação fundamental entre o empregador capitalista e o operário como uma questão secundária, cometeram, portanto, um erro, embora, por outro lado, tivessem razão ao afirmar que, em dadas circunstâncias, um aumento dos preços pode afetar de um modo muito desigual o empregador capitalista, o dono da terra, o capitalista que empresta dinheiro e, se quereis, o arrecadador de impostos.

Do exposto resulta ainda outra conseqüência: A parte do valor da mercadoria que representa unicamente o valor das matérias-primas e das máquinas, numa palavra, o valor dos meios de produção consumidos, não gera nenhum rendimento, mas se limita a repor o capital. Mas, afora isso, é falso que a outra parte do valor da mercadoria, que forma o rendimento, ou pode ser gasta sob a forma de salário, lucro, renda territorial e juro, seja constituída pelo valor dos salários, pelo valor da renda territorial, o valor do lucro, etc. Por ora deixaremos de lado os salários e só trataremos do lucro industrial, do juro e da renda territorial. Acabamos de ver que a mais-valia contida na mercadoria, ou a parte do valor desta na qual está incorporado o trabalhio não remunerado, por sua vez se decompõe em várias partes, designadas por três nomes diferentes. Afirmar, porém, que seu valor se acha integrado, ou formado pela soma total dos valores independentes destas três partes constituintes, seria afirmar o inverso da verdade.

Se uma hora de trabalho se realiza num valor de 6 pence e se a jornada de trabalho do operário é de 12 horas e a metade deste tempo for trabalho não pago, este sobretrabalho acrescentará à mercadoria uma mais-valia de 3 xelins, isto é, um valor pelo qual não se paga nenhum equivalente. Esta mais-valia de 3 xelins representa todo o fundo que o empregador capitalista pode repartir, na proporção que fôr com o dono da terra e com o emprestador de dinheiro. O valor destes 3 xelins forma o limite do valor que eles podem repartir entre si. Mas, não é o empregador capitalista que acrescenta ao valor da mercadoria um valor arbitrário para seu lucro, acrescentando em seguida outro valor para o proprietário da terra e assim por diante, de tal maneira que a soma destes valores arbitrariamente fixados constituísse o valor total. Vêdes, portanto, o erro da idéia correntemente exposta, que confunde a divisão de um dado valor em três partes, com a formação desse valor, mediante a soma de três valores independentes, convertendo desta maneira numa grandeza arbitrária o valor total, de onde saem a renda territorial, o lucro e o juro.

Se o lucro total obtido por um capitalista for de 100 !ibras esterlinas, chamamos a esta soma, considerada como grandeza absoluta, o montante do lucro. Mas se calculamos a proporção entre estas 100 libras e o capital desembolsado, a esta grandeza relativa chamamos taxa de lucro. É evidente que se pode expressar esta taxa de lucro sob duas formas.

Vamos supor seja de 100 libras o capital desembolsado em salários. Se a mais-valia obtida for também de 100 libras - o que nos demonstraria que a metade da jornada de trabalho do operário se compõe de trabalho não remunerado - e se medíssemos este lucro pelo valor do capital desembolsado em salários, diríamos que a taxa de lucro era de 100 por cento, já que o valor desembolsado seria 100 e o valor produzido 200.

Se, por outro lado, não só considerássemos o capital desembolsado em salários, mas todo o capital desembolsado, digamos, por exemplo, 500 libras, das quais 400 representam valor das matérias-primas, maquinaria, etc., diríamos que taxa de lucro apenas se elevava a 20 por cento, visto o lucro de 100 não ser mais que a quinta parte do capital total desembolsado.

O primeiro modo de expressar a taxa de lucro é o único que nos revela a proporção real entre o trabalho pago e o não remunerado, o grau real da"exploitation" [7] do trabalho (permiti-me o uso desta palavra francesa). A outra forma é a usual, e para certos fins é, com efeito, a mais indicada. Em todo caso, prova ser muito útil, por ocultar o grau em que o capitalista arranca do operário trabalho gratuito.

Nas observações que ainda me restam por fazer, empregarei a palavra lucro para exprimir o montante total de mais-valia extorquida pelo capitalista, sem me preocupar com a divisão desta mais-valia entre as diversas partes interessadas, e quando usar o termo taxa de lucro medirei sempre o lucro pelo valor do capital desembolsado em salários.

12 - A relacão geral entre os lucros, salários e preços

Se do valor de uma mercadoria descontamos a parte que se limita a repor o das matérias-primas e outros meios de produção empregados, isto é, se descontarmos o valor que representa o trabalho pretérito nela encerrado, o valor restante reduzir-se-á à quantidade de trabalho acrescentada pelo operário que por último se ocupa nela. Se este operário trabalha 12 horas diárias e 12 horas de trabalho médio cristalizam-se numa soma de ouro igual a 6 xelins, este valor adicional de 6 xelins será o único valor criado por seu trabalho. Este valor dado, determinado por seu tempo de trabalho, é o único fundo do qual tanto ele como o capitalista têm de retirar a respectiva participação ou dividendo, é o único valor a ser dividido entre salários e lucros. É evidente que este valor não será em si mesmo alterado pelas proporções variáveis em que possa dividir-se entre ambas as partes. E tampouco haverá alteração se, em vez de um operário isolado, pomos toda a população trabalhadora, 12 milhões de jornadas de trabalho, por exemplo, em vez de uma.

Como o capitalista e o operário só podem dividir este valor limitado, isto é, o valor medido pelo trabalho total do operário, quanto mais perceba um deles, menos obterá o outro, e reciprocamente. Partindo de uma dada quantidade, uma das partes aumentará sempre na mesma proporção em que a outra diminui. Se os salários se modificam, modificar-se-ão em sentido oposto aos lucros. Se os salários baixam, subirão os lucros; e se os salários sobem, baixarão os lucros. Se o operário, na nossa suposição anterior, ganha 3 xelins, equivalentes à metade do valor criado por ele, ou se a metade da sua jornada de trabalho total é trabalho pago e a outra metade trabalho não remunerado, a taxa de lucro será de 100 por cento, visto que o capitalista obterá também 3 xelins. Se o operário só recebe 2 xelins, ou só trabalha para ele a terça parte da jornada total, o capitalista obterá 4 xelins e a taxa de lucro será, neste caso, de 200 por cento. Se o operário percebe 4 xelins, o capitalista só poderá embolsar 2, e a taxa de lucro descerá, portanto, a 50 por cento. Mas todas estas variações não influem no valor da mercadoria. Logo, um aumento geral de salários determinaria uma diminuição da taxa geral de lucro, mas não afetaria os valores.

No entanto, embora os valores das mercadorias, que, em última instância, hão de regular seus preços no mercado, estejam determinados exclusivamente pela quantidade total de trabalho plasmado neles, e não pela divisão desta quantidade em trabalho pago e trabalho não remunerado, daqui não se deduz de modo algum que os valores das diversas mercadorias ou lotes de mercadorias fabricadas em 12 horas, por exemplo, sejam sempre os mesmos. O número, ou a massa das mercadorias fabricadas num determinado tempo de trabalho, ou mediante uma determinada quantidade de trabalho, depende da força produtiva do trabalho empregado e não da sua extensão ou duração. Com um dado grau das forças produtivas do trabalho de fiação, por exemplo, poderão produzir-se numa jornada de trabalho de 12 horas, 12 libras-peso de fio; com um grau mais baixo de força produtiva produzir-se-ão tão somente duas. Portanto, no primeiro caso, se as 12 horas de trabalho médio se materializam num valor de 6 xelins, as 12 libras-peso de fio custarão 6 xelins, justamente o que custariam, no segundo caso, as duas libras. Quer dizer que no primeiro caso a libra-peso de fio sairá por 6 pence e no segundo, por 3 xelins. Esta diferença de preço seria uma conseqüência da diferença existente entre as forças produtivas do trabalho empregado. Com a maior força produtiva, uma hora de trabalho rnaterializar-se-ia numa libra-peso de fio, ao passo que, com a força produtiva menor, para obter uma libra de fio haveria necessidade de 6 horas de trabalho. No primeiro caso, o preço da libra de fio não excederia 6 pence apesar de os salários serem relativamente altos e a taxa de lucro, baixa; no segundo caso, se elevaria a 3 xelins, mesmo com salários baixos e com uma taxa de lucro elevada. Assim sucederia porque o preço da libra-peso de fio é determinado pelo total do trabalho que encerra e não pela proporção em que este total se divide em trabalho pago e não pago. O fato, antes apontado por mim, de que um trabalho bem pago pode produzir mercadorias baratas, e um mal pago mercadorias caras, perde, com isto, a sua aparência paradoxal. Não é mais que a expressão da lei geral de que o valor de uma mercadoria se determina pela quantidade de trabalho nela invertido e de que esta quantidade de trabalho invertido depende exclusivamente da força produtiva do trabalho empregado, variando, por conseguinte, ao variar a produtividade do trabalho.

13 - Casos principais de luta pelo aumento de salários ou contra a sua redução

Examinemos agora seriamente os casos principais em que se intenta obter um aumento dos salários, ou se opõe uma resistência à sua redução.

1 - Vimos que o valor da força de trabalho, ou, em termos mais populares, o valor do trabalho, é determinado pelo valor dos artigos de primeira necessidade ou pela quantidade de trabalho necessária à sua produção. Por conseguinte, se num determinado país o valor dos artigos de primeira necessidade, em média diária consumidos por um operário, representa 6 horas de trabalho, expressa em 3 xelins, este trabalhador terá de trabalhar 6 horas por dia a fim de produzir um equivalente do seu sustento diário. Sendo de 12 horas a jornada de trabalho. o capitalista pagar-lhe-ia o valor de seu trabalbo entregando-lhe 3 xelins. Metade da jornada de trabalho será trabalho não remunerado e, portanto, a taxa de lucro se elevará a 100 por cento. Mas vamos supor agora que, em conseqüência de uma diminuição da produtividade, se necessite de mais trabalho para produzir, digamos, a mesma quantidade de produtos agrícolas que dantes, com o que o preço médio dos víveres diariamente necessários subirá de 3 para 4 xelins. Neste caso, o valor do trabalho aumentaria de um terço, ou seja, de 33,3 por cento. A fim de produzir o equivalente do sustento diário do trabalhador, dentro do padrão de vida anterior, seriam precisas 8 horas de jornada de trabalho. Logo, o sobretrabalho diminuiria de 6 para 4 horas e a taxa de lucro se reduziria de 100 para 50 por cento. O trabalhador que nestas condições pedisse um aumento de salário limitar-se-ia a exigir que lhe pagassem o valor incrementado de seu trabalho, como qualquer outro vendedor de uma mercadoria que, quando aumenta o custo de produção desta, age de modo a conseguir que o comprador lhe pague esse incremento do valor. E se os salários não sobem, ou não sobem em proporcões suficientes para compensar o incremento do valor aos artigos de primeira necessidade, o preço do trabalho descerá abaixo do valor do trabalho e o padrão de vida do trabalhador piorará.

Mas também pode operar-se uma mudança em sentido contrário. Ao elevar-se a produtividade do trabalho, pode acontecer que a mesma quantidade de artigos de primeira necessidade, consumidos em média, diariamente, baixe de 3 para 2 xelins, ou que, em vez de 6 horas de jornada de trabalho, bastem 4 para produzir o equivalente do valor dos artigos de primeira necessidade consumidos num dia. O operário poderia, então, comprar por 2 xelins exatamente os mesmos artigos de primeira necessidade que antes lhes custavam 3. Na realidade teria baixado o valor do trabalho; mas este valor diminuido disporia da mesma quantidade de mercadorias que antes. O lucro subiria de 3 para 4 xelins e a taxa de lucro, de 100 para 200 por cento. Ainda que o padrão de vida absoluto do trabalhador continuasse sendo o mesmo, seu salário relativo e, portanto, a sua posição social relativa, comparada com a do capitalista, teria piorado. Opondo-se a esta redução de seu salário relativo, o trabalhador não faria mais que lutar para obter uma parte das forças produtivas incrementadas do seu próprio trabalho e manter a sua antiga situação relativa na escala social. Assim, após a abolição das Leis Cerealistas e violando, flagrantemente, as promessas soleníssimas que haviam feito, em sua campanha de propaganda contra aquelas leis, os donos das fábricas inglêsas diminuíram em geral os salários de 10 por cento. A princípio, a oposição dos trabalhadores foi frustrada; porém, mais tarde, logrou-se a recuperação dos 10 por cento perdidos, em conseqüência de circunstâncias que não me posso deter a examinar agora.

2. - Os valores dos artigos de primeira necessidade e, por conseguinte, o valor do trabalho podem permanecer invariáveis, mas o preço deles em dinheiro pode sofrer alteração desde que se opere uma prévia modificação no valor do dinheiro.

Com a descoberta de jazidas mais abundantes, etc., 2 onças de ouro, por exemplo, não suporiam mais trabalho do que antes exigia a produção de uma onça. Neste caso, o valor do ouro baixaria à metade, a 50 por cento. E como, em conseqüência disto, os valores das demais mercadorias se expressariam no dobro do seu preço em dinheiro anterior, o mesmo aconteceria com o valor do trabalho. As 12 horas de trabalho, que antes se expressavam em 6 xelins, agora se expressariam em 12. Logo, se o salário do operário continuasse a ser de 3 xelins, em vez de ir a 6, resultaria que o preço em dinheiro do seu trabalho só corresponderia. à metade do valor do seu trabalho, e seu padrão de vida pioraria assustadoramente. O mesmo ocorreria, em grau maior ou menor, se o seu salário subisse, mas não proporcionalmente à baixa do valor do ouro. Em tal caso, não se tepia operado a menor mudança, nem nas forças produtivas do trabalho, nem na oferta e procura, nem tampouco nos valores. Só teria mudado o nome em dinheiro destes valores. Dizer, neste caso, que o operário deve lutar pelo aumento proporcional do seu salário, equivale a pedir-lhe que se resigne a que se lhe pague o seu trabalho com nomes não com coisas. Toda a história do passado prova que sempre que se produz uma depreciação do dinheiro, os capitalistas se aprestam para tirar proveito da conjuntura e enganar os operários. Uma grande escola de economistas assevera que, em conseqüência das novas descobertas de terras auríferas, da melhor exploração das minas de prata e do barateamento do fornecimento do mercúrio, voltou a se depreciar o valor dos metais preciosos. Isto explicaria as tentativas generalizadas e simultâneas que se fazem no Continente para conseguir um aumento de salários.

3. - Até aqui partimos da suposição de que a jornada de trabalho tem limites dados. Mas, na realidade, essa jornada, em si mesma, não tem limites constantes. O capital tende constantemente a dilatá-la ao máximo de sua possibilidade física, já que na mesma proporção aumenta o sobretrabalho e, portanto, o lucro que dele deriva. Quanto mais êxito tiverem as pretensões do capital para alongar a jornada de trabalho, maior será a quantidade de trabalho alheio de que se apropriará. Durante o século XVII, e até mesmo durante os primeiros dois terços do XVIII, a jornada normal de trabalho, em toda Inglaterra, era de 10 horas. Durante a guerra contra os jacobitas, [8] que, foi, na realidade, uma guerra dos barões ingleses contra as massas trabalhadoras inglêsas, o capital viveu dias de orgia e prolongou a jornada de 10 para 12, 14 e 18 horas. Malthus, que não pode precisamente infundir suspeitas de terno sentimentalismo, declarou num folheto, publicado por volta de 1815, que a vida da nação estava ameaçada em suas raizes, caso as coisas continuassem assim. Alguns anos antes da generalização dos novos inventos mecânicos, cerca de 1765, veio à luz na Inglaterra um folheto intitulado An Essay on Trade ["Um Ensaio Sõbre o Comércio"]. O anônimo autor deste folheto, inimigo jurado da classe operária, clama pela necessidade de estender os limites da jornada de trabalho. Entre outras coisas, propõe criar, com este objetivo, casas de trabalho para pobres que, diz ele, deveriam ser "casas de terror". E qual é a duração da jornada de trabalho proposta para estas"casas de terror"? Doze horas, quer dizer, precisamente a jornada que, em 1832, os capitalistas, os economistas e os ministros declaravam não só vigente de fato, mas também o tempo de trabalho necessário para as crianças menores de 12 anos.

Ao vender a sua força de trabalho ,- e o operário é obrigado a fazê-lo, no regime atual -, ele cede ao capitalista o direito de empregar esta força, porém dentro de certos limites racionais. Vende a sua força de trabalho para conservá-la ilesa, salvo o natural desgaste, porém não para destruí-la. E como a vende por seu valor diário, ou semanal, se subentende que num dia ou numa semana não se há de arrancar à sua força de trabalho um uso, ou desgaste de dois dias ou duas semanas. Tomemos uma máquina que valha 1 000 libras. Se ela se usa em dez anos, acrescentará no fim de cada ano 100 libras ao valor das mercadorias que ajuda a produzir. Se se usa em 5 anos, o valor acrescentado por ela será de 200 libras anuais,isto é, o valor de seu desgaste anual está em razão inversa à rapidez com que se esgota. Mas isto distingue o operário da máquina. A maquinaria não se esgota exatamente na mesma proporção em que se usa. Ao contrário, o homem se esgota numa proporção muito superior à que a mera soma numérica do trabalho acusa.

Nas tentativas para reduzir a jornada de trabalho à sua antiga duração racional, ou, onde não podem arrancar uma fixação legal da jornada normal de trabalho, nas tentativas para contrabalançar o trabalho excessivo por meio de um aumento de salário, aumento que não basta esteja em proporção com o sobretrabalho que os exaure, e deve, sim, estar numa proporção maior, os operários não fazem mais que cumprir um dever para com eles mesmos e a sua raça. Limitam-se a refrear as usurpações tirânicas do capital. O tempo é o campo do desenvolvimento humano. O homem que não dispõe de nenhum tempo livre, cuja vida, afora as interrupções puramente físicas do sono, das refeições, etc., está toda ela absorvida pelo seu trabalho para o capitalista, é menos que uma besta de carga. É uma simples máquina, fisicamente destroçada e espiritualmente animalizada, para produzir riqueza alheia. E, no entanto, toda a história da moderna indústria demonstra que o capital, se não se lhe põe um freio lutará ,sempre, implacavelmente e sem contemplações, para conduzir toda a classe operária a este nível de extrema degradação.

Pode acontecer que o capital, ao prolongar a jornada de trabalho, pague salários mais altos e que, sem embargo, o valor do trabalho diminua, se o aumento dos salários não corresponde à maior quantidade de trabalho extorquido e ao mais rápido esgotamento da força de trabalho que daí resultará. Isto pode ainda ocorrer de outro modo. Vossos estatísticos burgueses vos dirão, por exemplo, que os salários médios das famílias que trabalham nas fábricas do Lancashire subiram. Mas se esqueceram de que agora, em vez de ser só o homem, o cabeça da família, são também sua mulher e, talvez, três ou quatro filhos que se vêem lançados sob as rodas do carro de Jaguernaut [9] do capital e que a alta dos salários totais não corresponde à do sobretrabalho total arrancado à família.

Mesmo com uma jornada de trabalho de limites determinados, como existe hoje em dia em todas as indústrias sujeitas às leis fabris, pode-se tornar necessário um aumento de salários, ainda que somente seja com o fito de manter o antigo nível do valor do trabalho. Mediante o aumento da intensidade do trabalho, pode-se fazer que um homem gaste numa hora tanta força vital como antes em duas. É o que se tem produzido nas indústrias submetidas às leis fabris, até certo ponto, acelerando a marcha das máquinas e aumentando o número de máquinas de trabalho a que deve atender agora um só indivíduo. Se o aumento da intensidade do trabalho ou da quantidade de trabalho despendida numa hora se mantém abaixo da diminuição da jornada de trabalho, sairá então ganhando o operário. Se se ultrapassa este limite, perderá por um lado o que ganhar por outro, e 10 horas de trabalho o arruinarão tanto como antes 12. Ao contrabalançar esta tendência do capital, por meio da luta pela alta dos salários, na medida correspondente à crescente intensidade do trabalho, o operário não faz mais que opor-se à depreciação do seu trabalho e à degeneração da sua raça.

4. - Sabeis todos que, por motivos que não me cabe aqui explicar, a produção capitalista move-se através de determinados ciclos periódicos. Passa por fases de calma, de animação crescente, de prosperidade, de superprodução, de crise e de estagnação. Os preços das mercadorias no mercado e a taxa de lucro no mercado seguem estas fases; ora descendo abaixo de seu nível médio, ora ultrapassando-o. Se considerardes todo o ciclo, vereis que uns desvios dos preços do mercado são compensados por outros e que, tirando a média do ciclo, os preços das mercadorias do mercado se regulam por seus valores. Pois bem. Durante as fases de baixa dos preços no mercado e durante as fases de crise de estagnação, o operário, se é que não o põem na rua, pode estar certo de ver rebaixado o seu salário. Para que não o enganem, mesmo com essa baixa de preços no mercado, ver-se-á compelido a discutir com o capitalista em que proporção se torna necessário reduzir os salários. E se durante a fase de prosperidade, na qual o capitalista obtém lucros extraordinários, o operário não lutar por uma alta de salários, ao tirar a média de todo o ciclo industrial, veremos que ele nem sequer percebe o salário médio, ou seja, o valor do seu trabalho. Seria o cúmulo da loucura exigir que o operário, cujo salário se vê forçosamente afetado pelas fases adversas do ciclo, renunciasse ao direito de ser compensado durante as fases prósperas. Geralmente, os valores de todas as mercadorias só se realizam por meio da compensação que se opera entre os preços constantemente variáveis do mercado, variação proveniente das flutuações constantes da oferta e da procura. No âmbito do sistema atual, o trabalho é uma mercadoria, como outra qualquer. Tem, portanto, que passar pelas mesmas flutuações, até obter o preço médio que corresponde ao seu valor. Seria um absurdo considerá-lo como mercadoria para certas coisas e, para outras, querer excetuá-lo das leis que regem os preços das mercadorias. O escravo obtém uma quantidade constante e fixa de meios de subsistência; o operário assalariado, não. Ele não tem outro recurso senão tentar impor, em alguns casos, um aumento dos salários, ainda que seja apenas para compensar a baixa em outros casos. Se espontaneamente se resignasse a acatar a vontade, os ditames do capitalista, como uma lei econômica permanente compartilharia de toda a miséria do escravo, sem compartilhar, em troca, da segurança deste.

5. - Em todos os casos que considerei, e que representam 99 em 100, vistes que a luta pelo aumento de salários vai sempre na pista de modificações anteriores e é o resultado necessário das modificações prévias operadas no volume de produção, nas forças produtivas do trabalho, no valor deste, no valor do dinheiro, na maior extensão ou intensidade do trabalho extorquido nas flutuações dos preços do mercado, que dependem das flutuações da oferta e da procura e se verificam em função das diversas fases do ciclo industrial; numa palavra, é a reação dos operários contra a ação anterior do capital. Se focalizássemos a luta pelo aumento de salários fazendo caso omisso de todas estas circunstâncias, apenas considerando as modificações operadas nos salários e passando por cima de modificações outras, das quais elas provêm, partiríamos de uma falsa premissa para chegar a conclusões falsas.

14 - A luta entre o capital e o trabalho e seus resultados

1. - Após demonstrar que a resistência periódica que os trabalhadores opõem à redução dos salários e suas tentativas periódicas para conseguir um aumento de salários são fenômenos inseparáveis do sistema do salariado e ditadas pelo próprio fato de o trabalho se achar equiparado às mercadorias, por conseguinte submetido às leis que regulam o movimento geral dos preços, tendo demonstrado, ainda, que um aumento geral de salários resultaria numa diminuição da taxa geral de lucro, sem afetar, porém, os preços médios das mercadorias, nem os seus valores,surge a questão de saber até que ponto, na luta incessante entre o capital e o trabalho, tem este possibilidade de êxito.

Poderia responder com uma generalização, dizendo que o preço do trabalho no mercado, da mesma forma que o das demais mercadorias, tem que se adaptar, no decorrer do tempo, ao seu valor; que, portanto, a despeito de todas as altas e baixas e do que possa fazer, o operário acabará recebendo sempre, em média, somente o valor de seu trabalho, que se reduz ao valor da sua força de trabalho, a qual, por sua vez, é determinada pelo valor dos meios de subsistência necessários à sua manutenção e reprodução, valor esse regulado, em última análise, pela quantidade de trabalho necessária para produzi-los.

Mas há certos traços peculiares que distinguem o valor da força de trabalho, ou valor do trabalho, dos valores de todas as demais mercadorias. O valor da força de trabalho é formado por dois elementos, um dos quais puramente físico, o outro de caráter histórico e social. Seu limite mínimo é determinado pelo elemento físico, quer dizer , para poder manter-se e se reproduzir, para perpetuar a sua existência física, a classe operária precisa obter os artigos de primeira necessidade absolutamente indispensáveis à vida e à sua multiplicação. O valor destes meios de subsistência indispensáveis constitui, pois, o limite mínimo do valor do trabalho. Por outra parte, a extensão da jornada de trabalho também tem seus limites máximos, se bem que sejam muito elásticos. Seu limite máximo é dado pela força física do trabalhador. Se o esgotamento diário de suas energias vitais excede um certo grau, eIe não poderá fornecê-las outra vez, todos os dias. Mas, como dizia, esse limite é muito elástico. Uma sucessão rápida de gerações raquíticas e de vida curta manterá abastecido o mercado de trabalho tão bem como uma série de gerações robustas e de vida longa.

Além deste mero elemento físico, na determinação do valor do trabalho entra o padrão de vida tradicional em cada país. Não se trata somente da vida física, mas também da satisfação de certas necessidades que emanam das condições sociais em que vivem e se criam os homens. O padrão de vida inglês poderia baixar ao irlandês; o padrão de vida de um camponês alemão ao de um camponês livônio. A importância do papel que, a este respeito, desempenham a tradição histórica e o costume social podereis vê-Ia no livro do sr. Thornton sobre a "Superpopulação", onde ele mostra que, em distintas regiões agrícolas da Inglaterra de nossos dias, os salários médios continuam a ser hoje diferentes, conforme as condições mais ou menos favoráveis em que essas regiões saíram da servidão.

Este elemento histórico ou social, que entra no valor do trabalho, pode acentuar-se, ou debilitar-se e, até mesmo, extinguir-se de todo, de tal modo que só fique de pé o limite físico.

Durante a guerra contra os jacobitas, que, como costumava dizer o incorrigível devorador de impostos e prebendas, o velho George Rose, foi empreendida para que esses descrentes franceses não destruíssem os consolos da nossa santa religião, os honestos fazendeiros inglêses, a quem tratamos com tanto carinho num capítulo anterior, fizeram baixar os salários dos trabalhadores do campo para além daquele mínimo estritamente físico, completando a diferença indispensável para assegurar a perpetuação física da raça, mediante as leis dos pobres. Era um glorioso método para converter o trabaIhador assalariado em escravo e orgulhoso yeoman de Shakespeare em mendigo.

Se comparais os salários normais ou valores do trabalho em diversos países e em épocas históricas distintas, dentro do mesmo país, vereis que o valor do trabalho não é por si uma grandeza constante, mas variável, mesmo supondo que os valores das demais mercadorias permaneçam fixos.

Um estudo comparativo semelhante das taxas de lucro no mercado provaria que não só elas se modificam como também as suas taxas médias.

Mas, no que se refere ao lucro, não existe nenhuma lei que lhe fixe o mínimo. Não podemos dizer qual seja o limite extremo de sua baixa. E por que não podemos estabelecer esse limite? Porque, embora possamos fixar o salário mínimo, não podemos fixar o salário máximo. Só podemos dizer que, dados os limites da jornada de trabalho, o máximo de lucro corresponde ao mínimo físico dos salários e que, partindo de dados salários, o máximo de lucro corresponde ao prolongamento da jornada de trabalho na medida em que seja compatível com as forças físicas do operário. Portanto, o máximo de lucro só se acha limitado pelo mínimo físico dos salários e pelo máximo físico da jornada de trabalho. É evidente que, entre os dois limites extremos da taxa máxima de lucro, cabe uma escala imensa de variantes. A determinação de seu grau efetivo só fica assente pela luta incessante entre o capital e o trabalho; o capitalista, tentando constantemente reduzir os salários ao seu mínimo físico e a prolongar a jornada de trabalho ao seu máximo físico, enquanto o operário exerce constantemente uma pressão no sentido contrário.

A questão se reduz ao problema da relação de forças dos combatentes.

2. - Pelo que concerne à limitação da jornada de trabalho, tanto na Inglaterra como em todos os outros países, nunca foi ela regulamentada senão por intervenção legislativa.E sem a constante pressão dos operários agindo por fora, nunca essa intervenção se daria. Em todo caso, este resultado não teria sido alcançado por meio de convênios privados entre os operários e os capitalistas. E esta necessidade mesma de uma ação política geral é precisamente o que demonstra que, na luta puramente econômica, o capital é a parte mais forte.

Quanto aos limites do valor do trabalho, sua fixação efetiva depende sempre da oferta e da procura, e refiro-me à procura de trabalho por parte do capitalista e à oferta de trabalho pelos operários. Nos países coloniais, [10] a lei da oferta e da procura favorece os operários. Daqui resulta o nível relativamente elevado dos salários nos Estados Unidos. Nestes países, faça o que fizer o capital, ele não pode nunca evitar que o mercado de trabalho esteja constantemente desabastecido pela constante transformação dos trabalhadores assalariados em lavradores independentes com fontes próprias de subsistência. Para grande parte da população norte-americana, a posição de assalariados não é mais do que uma estação de trânsito, que estão seguros de abandonar, mais tarde ou mais cedo. Para remediar este estado colonial de coisas, o paternal governo britânico adotou, há tempos, a chamada teoria moderna da colonização, que consiste em atribuir às terras coloniais um preço artificialmente elevado para, deste modo,obstar à transformação demasiado rápida do trabalhado assalariado em lavrador independente.

Mas passemos agora aos velhos países civilizados onde o capital domina todo o processo de produção. Tomemos, por exemplo, a elevação dos salários agrícolas ingleses, de 1849 a 1859. Qual foi a sua conseqüência? Os agricultores não puderam elevar o valor do trigo, como lhes teria aconselhado nosso amigo Weston, nem sequer o seu preço no mercado. Ao contrário, tiveram que resignar-se a vê-lo baixar. Mas durante estes onze anos introduziram máquinas de todas as classes e novos métodos científicos, transformaram urna parte das terras de lavoura em pastagens, aumentaram a extensão de suas fazendas e com ela a escala de produção; e por estes e outros processos, fazendo diminuir a procura de trabalho graças ao aumento de suas forças produtivas, tornaram a criar um excedente relativo da população de trabalhadores rurais. Tal é o método geral segundo o qual opera o capital nos países antigos, de bases sólidas, para reagir, mais rápida ou mais lentamente, contra os aumentos de salários. Ricardo observou, com exatidão, que a máquina está em continua concorrência com o trabalho e, amiúde, só pode ser introduzida quando o preço do trabalho alcança certo limite; mas a aplicação da maquinaria é apenas um dos muitos métodos empregados para aumentar a força produtiva do trabalho. Este mesmo processo, que cria uma superabundância relativa de trabalho ordinário, simplifica muito o trabalho qualificado e, portanto, o deprecia.

A mesma lei se faz sentir em outra forma. Com o desenvolvimento das forças produtivas do trabalho, acelera-se a acumulação do capital, inclusive a despeito de uma taxa de salário relativamente alta. Daqui poderia inferir-se, conforme fêz Adam Smith, em cujos tempos a indústria moderna ainda estava na sua infância, que a acumulação acelerada do capital tem forçosamente que fazer pender a balança a favor do operário, por garantir uma procura crescente de seu trabalho. Situando-se no mesmo ponto de vista, há muitos autores contemporâneos que se assombram de que, apesar de nos últimos vinte anos, o capital inglês ter crescido mais rapidamente do que a população inglêsa, os salários nem por isso registram um aumento maior. Mas é que, simultâneamente, com a acumulação progressiva, opera-se uma mudança progressiva na composição do capital. A parte do capital global formada por capital fixo : maquinaria, matérias-primas, meios de produção de todo gênero, cresce com maior rapidez que a outra parte do capital destinada a salários, ou seja, à compra de trabalho. Esta lei foi estabelecida, sob uma forma mais ou menos precisa, pelos srs. Barton, Ricardo, Sismondi, prof. Richard Jones, prof. Ramsey, Cherbuliez e outros.

Se a proporção entre estes dois elementos do capital era, originariamente, de 1 para 1, com o progresso da indústria será de 5 para 1, e assim sucessivamente. Se de um capital global de 600 são desembolsados 300 para instrumentos, matérias-primas, etc., e 300 para salários, basta dobrar o capital global para ser possível absorver 600 operários em vez de 300. Mas, se de um capital de 600 se invertem 500 em maquinaria, materiais, etc., e somente 100 em salários, este capital precisa aumentar de 600 a 3 600, para criar uma procura de 600 operários em lugar de 300. Portanto, ao se desenvolver a índústria, a procura de trabalho não avança com o mesmo ritmo da acumulação do capital. Aumenta, sem dúvida, mas aumenta numa proporção constantemente decrescente, quando comparada com o incremento do capital.

Estas breves indicações bastarão para demonstrar, precisamente, que o próprio desenvolvimento da indústria moderna contribui por força para inclinar cada vez mais a balança a favor do capitalista contra o operário e que, em conseqüência disto, a tendência geral da produção capitalista não é para elevar o nível médio normal do salário, mas, ao contrário, para fazê-lo baixar, empurrando o valor do trabalho mais ou menos até seu limite mínimo. Porém, se tal é a tendência das coisas neste sistema, quer isto dizer que a classe operária deva renunciar a defender-se contra os abusos do capital e abandonar seus esforços para aproveitar todas as possibilidades que se lhe ofereçam de melhorar em parte a sua situação? Se o fizesse, ver-se-ia degradada a uma massa informe de homens famintos e arrasados, sem probabilidade de salvação. Creio haver demonstrado que as lutas da classe operária em torno do padrão de salários são episódios inseparáveis de todo o sistema do salariado, que, em 99 por cento dos casos, seus esforços para elevar os salários não são mais que esforços destinados a manter de pé o valor dado do trabalho e que a necessidade de disputar o seu preço com o capitalista é inerente à situação em que o operário se vê colocado e que o obriga a vender-se a si mesmo como uma mercadoria. Se em seus conflitos diários com o capital cedessem covardemente ficariam os operários, por certo, desclassificados para empreender outros movimentos de maior envergadura.

Ao mesmo tempo, e ainda abstraindo totalmente a escravização geral que o sistema do salariado implica, a classe operária não deve exagerar a seus próprios olhos o resultado final destas lutas diárias. Não deve esquecer-se de que luta contra os efeitos, mas não contra as causas desses efeitos; que logra conter o movimento descendente, mas não fazê-lo mudar de direção; que aplica paliativos, mas não cura a enfermidade. Não deve, portanto, deixar-se absorver exclusivamente por essas inevitáveis lutas de guerrilhas, provocadas continuamente pelos abusos incessantes do capital ou pelas flutuações do mercado. A classe operária deve saber que o sistema atual, mesmo com todas as misérias que lhe impõe, engendra simultaneamente as condições materiais e as formas sociais necessárias para uma reconstrução econômica da sociedade. Em vez do lema conservador de: "Um salário justo por uma jornada de trabalho justa!", deverá inscrever na sua bandeira esta divisa revolucionária:"Abolição do sistema de trabalho assalariado!".

Depois desta exposição longuíssima e, receio eu, fatigante, que julguei indispensável para esclarecer um pouco o nosso tema principal, vou concluir, propondo a aprovação da resolução seguinte:

1. - Uma alta geral da taxa de salários acarretaria uma baixa da taxa geral de lucro, mas não afetaria, em linhas gerais, os preços das mercadorias.

2. - A tendência geral da produção capitalista não é para elevar o padrão médio de salários, mas para reduzi-lo.

3. - Os sindicatos trabalham bem como centro de resistência contra as usurpações do capital. Falham em alguns casos, por usar pouco inteligentemente a sua força. Mas, são deficientes, de modo geral, por se limitarem a uma luta de guerrilhas contra os efeitos do sistema existente, em lugar de ao mesmo tempo se esforçarem para mudá-lo, em lugar de empregarem suas forças organizadas como alavanca para a emancipação final da classe operária, isto é, para a abolição definitiva do sistema de trabalho assalariado.


Notas:

7. Exploração. (retornar ao texto)

8. Partidários de Jacques II e da Casa dos Stuarts,afastados pela revolução de 1688. (retornar ao texto)

9. Jaguernaut é o nome de uma das formas do deus hindu Vishnu.A imagem do deus era levada em procissão sobre um pesado carro debaixo do qual se atiravam para perecer diversos fanáticos. (retornar ao texto)

10."Aqui nos referimos às verdadeiras colônias,às terras virgens colonizadas por emigrantes livres.Os Estados Unidos,num sentido econômico,ainda são uma colônia da Europa.Quanto mais isto diz respeito ,também,àquelas antigas plantações nas quais a abolição da escravatura transformou completamente as condições anteriores." Karl Marx, O Capital, t.1, cap. XXV. (retornar ao texto)

Inclusão 15/01/2003