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Projecto de Resolução Sobre o Momento Político Actual[N125]
V. I. Lénine
3 (16) de Setembro de 1917
Transcrição autorizada |
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Escrito: não depois de 3 (16) de Setembro de 1917.
Primeira Edição: em 1925 na Colectânea Leninista, t. IV.
Fonte: Obras Escolhidas em Três Tomos, 1978, t2, pp 160-164, Edições Avante! - Lisboa, Edições Progresso - Moscovo.
Tradução: Edições "Avante!" com base nas Obras Completas de V. I. Lénine, 5.ª ed. em russo, t. 34, pp. 144-150.
Transcrição: Partido Comunista Português
Enviado: Diego Grossi Pacheco
HTML: Fernando A. S. Araújo, março 2009.
Direitos de Reprodução: © Direitos de tradução em língua portuguesa reservados por Edições
"Avante!" - Edições Progresso Lisboa - Moscovo, 1977.
Com base na resolução sobre a situação política adoptada pelo Sexto Congresso do POSDR (bolchevique)[N126] e aplicando a referida resolução ao momento presente, o CC do POSDR, na sua reunião plenária, declara:
- Em dois meses, de 3 de Julho ate 3 de Setembro, o curso da luta de classes e o desenvolvimento
dos acontecimentos políticos, em consequência da inaudita velocidade da revolução, fizeram
avançar todo o país tanto como não o teria feito uma longa série de anos em tempo de paz, sem
revolução e sem guerra.
- Torna-se cada vez mais evidente que os acontecimentos de 3-5 de Julho foram o ponto de ruptura
de toda a revolução. Sem uma apreciação correcta desses acontecimentos não é possível uma
apreciação correcta quer das tarefas do proletariado quer da rapidez do desenvolvimento dos
acontecimentos revolucionários, independente da nossa vontade.
- As calúnias difundidas com incrível zelo pela burguesia contra os bolcheviques, e a sua
extraordinariamente ampla divulgação entre as massas do povo graças aos milhões investidos nos
jornais e editoras capitalistas, estas calúnias desmascaram-se cada vez com maior amplitude e
rapidez. Torna-se cada vez mais evidente, para massas operárias da capital e das grandes cidades
primeiro, e depois para o campesinato, que as calúnias contra os bolcheviques são uma das principais armas dos latifundiários e dos capitalistas na luta contra os defensores dos interesses dos operários e dos camponeses pobres, isto é, contra os bolcheviques.
- A insurreição de Kornílov, isto é, dos generais e dos oficiais atrás dos quais estão os latifundiários
e os capitalistas, tendo a sua frente o partido dos democratas-constitucionalistas (partido da «liberdade do povo»), esta insurreição tentou claramente encobrir-se com a repetição das velhas
calúnias contra os bolcheviques e foi isto que facilitou o definitivo abrir de olhos das mais amplas
massas populares acerca do verdadeiro significado das calúnias da burguesia contra o partido
operário bolchevique, contra o partido dos autênticos defensores dos pobres.
- Se o nosso partido se tivesse recusado a apoiar o movimento de massas de 3-4 de Julho, que
irrompeu espontaneamente apesar dos nossos esforços para o deter, teria sido uma traição directa e
completa ao proletariado, pois as massas puseram-se em movimento, indignadas justa e
legitimamente pelo prolongamento da guerra imperialista, isto é, de conquista e rapina, feita no
interesse dos capitalistas, e pela inacção do governo e dos Sovietes perante a burguesia, que acentua
e agrava a ruína e a fome.
- A despeito de todos os esforços da burguesia e do governo, a despeito da prisão de centenas de
bolcheviques, da confiscação dos seus papéis e documentos, das buscas às redacções, etc; a
despeito de tudo isso não se conseguiu nem se conseguirá provar nunca a calúnia segundo a qual o
nosso partido atribuía ao movimento de 3-4 de Julho outro objectivo que não fosse uma
manifestação «pacífica e organizada» sob a palavra de ordem da passagem de todo o poder de
Estado para os Sovietes de deputados operários, soldados e camponeses.
- Teria sido errado se os bolcheviques se tivessem proposto como objectivo em 3-4 de Julho a
tarefa da tomada do poder, pois a maioria, não só do povo, mas também dos operários, não tinha
experimentado ainda na prática a política contra-revolucionária dos generais no exército, dos
latifundiários no campo e dos capitalistas na cidade, política que se revelou perante as massas
depois de 5 de Julho e que era fruto da política de acordos dos socialistas-revolucionários e mencheviques com a burguesia. Mas nenhuma organização do nosso partido, nem central nem
local, não só não apresentou nem oralmente nem por escrito a palavra de ordem da conquista do
poder em 3-4 de Julho, mas também nem sequer pôs esta questão à discussão.
- O verdadeiro erro do nosso partido nos dias 3-4 de Julho, agora evidenciado pelos
acontecimentos, consistiu simplesmente em que o partido considerou a situação de todo o povo
menos revolucionária do que ela se revelou, em que o partido considerou ainda possível o
desenvolvimento pacífico das transformações políticas pela via da modificação da política dos
Sovietes, quando na realidade os mencheviques e socialistas-revolucionários se tinham já enredado
e ligado tanto com a política de acordos com a burguesia, e a burguesia se tinha tornado tão contra-revolucionária, que não se podia sequer falar de qualquer desenvolvimento pacífico. Mas esta falsa
opinião, assente apenas na esperança de que os acontecimentos não se desenvolveriam com
demasiada rapidez, esta falsa opinião só podia ser superada pelo partido com a participação no
movimento popular de 3-4 de Julho com a palavra de ordem «todo o poder aos Sovietes» e com o
objectivo de imprimir ao movimento um caracter organizado e pacífico.
- O significado histórico da insurreição de Kornílov consiste precisamente que abriu com força
extraordinária os olhos às massas do povo para a verdade que os socialistas-revolucionários e mencheviques escondiam, e continuam a esconder até agora sob frases conciliatórias, a saber: os
latifundiários e a burguesia, com o partido dos democratas-constitucionalistas à frente, e com
os generais e oficiais que estão do seu lado, organizaram-se e estão dispostos a cometer e cometem
os crimes mais inauditos, a entregar Riga (e depois também Petrogrado) aos alemães, a abrir-lhes a
frente, a colocar sob a metralha os regimentos bolcheviques, a iniciar uma rebelião, a dirigir as
tropas para a capital, com a «divisão selvagem» à frente, etc; tudo isso para que a burguesia tome
todo o poder nas suas mãos, para reforçar o poder dos latifundiários no campo, para inundar o país
com o sangue dos operários e camponeses
A insurreição de Kornílov demonstrou na Rússia aquilo que toda a história demonstrou em todos os países, a saber: que a burguesia, apenas para manter o seu poder sobre o povo e os seus lucros, trai a pátria e comete todos os crimes.
- Para os operários e camponeses da Rússia não há absolutamente nenhuma outra saída além da luta mais decidida e da vitória sobre os latifundiários e a burguesia, sobre o partido dos democratas-constitucionalistas, sobre os generais e oficiais que simpatizam com ele. Mas só a classe operária das cidades poderá conduzir o povo, isto é, todos os trabalhadores, para essa luta e para essa vitória, se passar para as suas mãos o poder de Estado e se for apoiada pelos camponeses pobres.
- Os acontecimentos na revolução russa, sobretudo depois de 6 de Maio, e mais ainda depois de
3 de Julho, desenvolvem-se com uma tão incrível rapidez de turbilhão ou de furacão que a tarefa do
partido não pode ser de modo algum a sua aceleração; pelo contrario, todos os esforços devem
orientar-se para não ficar atrás dos acontecimentos e avançar a tempo com o nosso trabalho de
esclarecimento possível dos operários e trabalhadores sobre as mudanças na situação e no curso da
luta de classes. Tal é também agora a principal tarefa do partido: explicar às massas que a situação é
extremamente crítica, que qualquer acção pode terminar numa explosão, razão por que uma
insurreição prematura poderia trazer o maior prejuízo. Mas, ao mesmo tempo, a situação crítica leva
inevitavelmente a que a classe operária — e talvez com uma rapidez catastrófica —, em virtude da
viragem dos acontecimentos independentemente da sua vontade, se veja obrigada a entrar num
combate decisivo com a burguesia contra-revolucionária e a conquistar o poder.
- A insurreição de Kornílov revelou plenamente o facto de que o exército, todo o exército, odeia o
quartel-general. Tiveram que reconhecê-lo até os mencheviques e os socialistas-revolucionários,
que durante meses de esforços mostraram o seu ódio aos bolcheviques e a sua defesa da política de
acordos dos operários e camponeses com os latifundiários e a burguesia. O ódio do exército ao
quartel-general não enfraquece, antes se reforça, depois de o governo de Kérenski se ter limitado a
substituir Kornílov por Alexéev, deixando nos seus lugares Klembóvski e outros generais kornilovistas e nao fazendo nada de sério para democratizar o exército e eliminar os contra-revolucionários do corpo de comando. Os Sovietes, que toleram e apoiam esta política débil,
vacilante e sem princípios de Kérenski, os Sovietes que perderam mais uma oportunidade de tomar
pacificamente todo o poder no momento da liquidação da insurreição de Kornílov, estes Sovietes
tornam-se culpados não só de praticar uma política de acordos mas também de uma política de
acordos criminosa.
O exército, que odeia o quartel-general e não quer fazer a guerra, para cujo caracter de conquista já abriu os olhos, está inevitavelmente condenado a novas catástrofes.
- A classe operária, quando tiver conquistado o poder, é a única que pode realizar uma política de paz não em palavras, como realizariam os mencheviques e socialistas-revolucionários, que na realidade apoiam a burguesia e os seus tratados secretos, mas de facto. A saber: ela, imediatamente e qualquer que seja a situação militar, mesmo se os generais kornilovistas tendo entregue Riga, entregarem também Petrogrado, proporá a todos os povos condições abertas, precisas, claras e justas de paz. A classe operária pode fazê-lo em nome de todo o povo, porque a esmagadora maioria dos operários e camponeses da Rússia manifestou-se contra a guerra de conquista actual e a favor de uma paz em condições justas, sem anexações (conquistas) nem contribuições.
Os socialistas-revolucionários e mencheviques, que há vários meses falam de tal paz enganam-se a si próprios e enganam o povo. A classe operária, tendo tornado o poder, propô-la-á a todos sem perder um único dia.
Os capitalistas de todos os países contêm com tanta dificuldade a revolução operária contra a guerra que cresce por toda a parte que, se a revolução russa passar dos suspiros impotentes e piedosos a propósito da paz para a sua proposta directa, acompanhada da divulgação e do rompimento dos tratados secretos, etc, há noventa e nove probabilidades em cem de que a paz surja rapidamente, de que os capitalistas não possam impedir a paz.
E se se der o caso menos provável de os capitalistas, apesar da vontade dos seus povos, rejeitarem as condições de paz do governo operário russo, a revolução na Europa tornar-se-á cem vezes mais próxima, e o exército dos nossos operários e camponeses, tendo escolhido superiores e chefes militares respeitados e não odiados, convencer-se-á da justeza da guerra depois da proposta de paz, da anulação dos tratados secretos, da ruptura da aliança com os latifundiários e a burguesia, da entrega de toda a terra aos camponeses. Só então a guerra será uma guerra justa por parte da Rússia, a única guerra que os operários e os camponeses travarão por sua própria vontade, e não pela força, e esta guerra aproximará ainda mais a inevitável revolução operária nos países avançados.
- A classe operária, quando tiver conquistado o poder, será a única que pode garantir a passagem imediata e sem indemnizações de todas as terras dos latifundiários para os camponeses. Isto não se pode adiar. A Assembleia Constituinte legaliza-lo-á, mas os camponeses não têm culpa do seu adiamento. E os camponeses convencem-se cada vez mais de que é impossível obter a terra pela via de um acordo com os latifundiários e os capitalistas. A terra só pode ser conseguida mediante a aliança fraterna e sem reservas dos camponeses pobres com os operários.
A saída de Tchernov do governo, depois de Tchernov, durante meses, ter tentado defender os interesses dos camponeses pela via das concessões concessõezinhas aos latifundiários-democratas-constitucionalistas e de todas as tentativas terem acabado na falência, esta saída revelou com particular clareza o carácter sem esperança da política de acordos. Entretanto, no plano local, o campesinato vê e sabe, sente e percebe como depois de 5 de Julho os latifundiários se tornaram arrogantes no campo e como é necessário dominá-los e neutralizá-los.
- A classe operária, quando tiver conquistado o poder, será a única que pode pôr fim à ruína e à
fome que nos ameaça. O governo, desde 6 de Maio, promete controlo e mais controlo, mas não fez
nem podia fazer nada, pois os capitalistas e latifundiários sabotam todo o trabalho. O desemprego
cresce, a fome aproxima-se, a moeda deprecia-se e a saída de Pechekhónov, depois da duplicação
dos preços fixos, acentuará a crise e mostrará uma vez mais toda a debilidade e impotência do
governo. Só o controlo operário da produção e da distribuição pode salvar a situação. Só um
governo operário dominará os capitalistas, incitará todos os trabalhadores a apoiar heroicamente os
esforços do poder, estabelecerá a ordem e organizará a troca regular do trigo por outros produtos.
- A confiança dos camponeses pobres na classe operária das cidades, abalada durante algum
tempo pelas calúnias da burguesia e pelas esperanças na política de acordos, restabelece-se
sobretudo depois que as prisões no campo e toda a espécie de perseguições aos trabalhadores depois
do 5 de Julho e, por fim, a insurreição de Kornílov, abriram os olhos do povo. Um dos sintomas da
perda de confiança do povo no acordo com os capitalistas consiste em que nos dois principais
partidos, dos socialistas-revolucionários e dos mencheviques, que introduziram e levaram até ao fim
essa política de acordos, cresce, sobretudo depois de 5 de Julho, o descontentamento dentro deles, a
luta contra a política de acordos, a oposição, que atingiu aproximadamente dois quintos (40%)
no último «Conselho» do partido dos socialistas-revolucionários e no congresso do partido dos mencheviques.
- Todo o curso dos acontecimentos, todas as condições económicas e políticas, todos os acontecimentos dentro do exército, preparam cada vez. mais depressa o êxito da conquista do poder pela classe operária, que dará a paz, o pão, a liberdade, que acelerará a vitória da revolução do proletariado também noutros países.
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Notas de fim de tomo:
[N125] O Projecto de Resolução Sobre o Momento Político Actual foi elaborado por Lénine para a reunião plenária do Comité Central do Partido Bolchevique marcada para o dia 3 (16) de Setembro. Contudo nessa data não se realizou a reunião plenária, mas uma reunião ordinária do CC em que não foi discutida a questão da situação política actual. Nas actas do CC do POSDR (b) existentes e referentes ao ano de 1917 não há referência à discussão deste projecto de resolução do Comité Central. (retornar ao texto)
[N126] O VI Congresso do POSDR(b) realizou-se em Petrogrado de 26 de Julho a 3 de Agosto (8 a 16 de Agosto) de 1917. As principais questões da ordem do dia eram o relatório político do Comité Central e o relatório sobre a situação política.
As directrizes de Lénine serviram de base à resolução do Congresso sobre a situação política. Nesta fazia-se a análise da situação política criada no país após os acontecimentos de Julho e expunha-se a linha política do partido na nova etapa da revolução. O Congresso considerou que o desenvolvimento pacífico da revolução terminara e que o poder passara de facto para as mãos da burguesia contra-revolucionária. O Congresso, seguindo as indicações de Lénine, retirou temporariamente a palavra de ordem "Todo o Poder aos Sovietes!", visto que estes, dirigidos pelos mencheviques e pelos socialistas-revolucionários, se tinham transformado num apêndice do Governo Provisório contra-revolucionário. Mas a retirada temporária dessa palavra de ordem não significava que o Partido Bolchevique renunciasse definitivamente aos Sovietes como forma estatal da ditadura do proletariado. O Congresso lançou a palavra de ordem de luta pela completa liquidação da ditadura da burguesia contra-revolucionária e pela conquista do poder pelo proletariado em aliança com os camponeses pobres por meio de uma insurreição armada. Nas suas resoluções o Congresso deu uma réplica decidida aos trotskistas, que se opunham à orientação do Partido para a revolução socialista e negavam a possibilidade da vitória do socialismo na Rússia antes do triunfo da revolução proletária na Europa Ocidental. O Congresso aprovou a plataforma económica do Partido Bolchevique e os novos Estatutos. Foi também decidida a não comparência de Lénine perante o tribunal do Governo Provisório contra-revolucionário.
O manifesto dirigido em nome do Congresso aos operários, soldados e camponeses exortava-os a acumularem forças e a prepararem-se, sob a bandeira do Partido Bolchevique, para o combate decisivo contra a burguesia. (retornar ao texto)