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Um poeta grego do tempo de Cícero, Antiparos, cantava deste modo a invenção da azenha (para moer os cereais): ia emancipar as mulheres escravas e voltar a trazer a idade de ouro:
"Poupai o braço que faz girar a mó, ó moleiras, e dormi tranqüilamente! Que o galo vos avise em vão de que já é dia! Dao impôs às ninfas o trabalho das escravas e ei-las que saltitam alegremente sobre a roda e eis que o eixo agitado rola com os seus raios, fazendo rodar a pesada pedra rolante. Vivamos da vida dos nossos pais e ociosos regozijemo-nos dos dons que a deusa nos concede."
Infelizmente, os tempos livres que o poeta pagão anunciava não vieram; a paixão cega, perversa e homicida do trabalho transforma a máquina libertadora em instrumento de sujeição dos homens livres: a sua produtividade empobrece-os.
Uma boa operária só faz com o fuso cinco malhas por minuto, alguns teares circulares para tricotar fazem trinta mil no mesmo tempo. Cada minuto à máquina equivale, portanto, a cem horas de trabalho da operaria; ou então cada minuto de trabalho da máquina dá à operária dez dias de repouso. Aquilo que se passa com a indústria de malhas é mais ou menos verdade para todas as indústrias renovadas pela mecânica moderna. Mas que vemos nós? A medida que a máquina se aperfeiçoa e despacha o trabalho do homem com uma rapidez e uma precisão incessantemente crescentes, o operário, em vez de prolongar o seu repouso proporcionalmente, redobra de ardor, como se quisesse rivalizar com a máquina. Ó concorrência absurda e mortal!
Para que a concorrência do homem e da máquina tomasse livre curso, os proletários aboliram as sábias leis que limitavam o trabalho dos artesãos das antigas corporações; suprimiram os dias feriados (1) Porque os produtores de então só trabalhavam cinco dias em sete, julgavam eles então, assim o contam os economistas mentirosos, que viviam só de ar e de água fresca? Ora vamos! Eles tinham tempos livres para gozar as alegrias da terra, para fazer amor, para se divertirem, para se banquetearem em honra do alegre deus da Mandriice. A triste Inglaterra, engaiolada no protestantismo, chamava-se então a "alegre Inglaterra" (Merry England).
Rabelais, Quevedo, Cervantes, os autores desconhecidos dos romances picarescos, fazem-nos crescer água na boca com as suas narrativas daquelas monumentais patuscadas (2) com que se regalavam então entre duas batalhas e duas devastações e nas quais tudo "era medido aos pratos". Jordaens e a escola flamenga escreveram-nas nas suas alegres telas. Sublimes estômagos gargantuescos, que é feito de vós? Sublimes cérebros que abarcáveis todo o pensamento humano, que é feito de vós? Estamos muito diminuídos e muito degenerados. A vaca atacada de raiva, a batata, o vinho com fucsina e a aguardente prussiana sabiamente combinados com o trabalho forçado debilitaram os nossos corpos e diminuíram os nossos espíritos. E foi então que o homem encolheu o seu estômago e que a máquina alargou a sua produtividade, é então que os economistas nos pregam a teoria malthusiana, a religião da abstinência e o dogma do trabalho? Mas era preciso arrancar-lhes a língua e deitá-la aos cães.
Porque a classe operária, com a sua boa fé simplista, se deixou doutrinar, porque, com a sua impetuosidade nativa, se precipitou cegamente para o trabalho e para a abstinência, a classe capitalista achou-se condenada à preguiça e ao prazer forçado, à improdutividade e ao superconsumo. Mas, se o supertrabalho do operário magoa a sua carne e atormenta os seus nervos, ele também é fecundo em dores para o burguês.
A abstinência à qual a classe produtiva se condena Obriga os burgueses a dedicarem-se ao superconsumo dos produtos que ela manufatura desordenadamente. No início da produção capitalista, há um ou dois séculos, o burguês era um homem ajuizado, de hábitos razoáveis e calmos; contentava-se com a sua mulher ou quase; bebia e comia moderadamente. Deixava aos cortesãos e às cortesãs as nobres virtudes da vida debochada. Hoje, não há filho de arrivista que não se julgue obrigado a desenvolver a prostituição e a mercurializar o seu corpo para dar um objetivo ao trabalho que os operários das minas de mercúrio se impõem; não há burguês que não se farte de capões trufados e de Laffitte navegado, para encorajar os criadores de La Fleche e os vinhateiros do Bordelais. Nesta profissão, o organismo deteriora-se rapidamente, os cabelos caem, os dentes descarnam-se até à raiz, o tronco deforma-se, o ventre entripa-se, a respiração complica-se, os movimentos tornam-se pesados, as articulações tornam-se anquilosadas, as falanges enodam-se. Outros, demasiado fracos para suportar as fadigas do deboche, mas dotados da bossa do prudhomismo, dessecam o seu cérebro como os Garnier da economia política, como os Acolias da filosofia jurídica, a elucubrar grossos livros soporíficos para ocupar os tempos livres dos compositores e dos tipógrafos.
As mulheres da alta sociedade têm uma vida de mártir. Para provarem e fazerem valer as "toilettes" feéricas que as costureiras se matam a fazer, andam de manhã à noite de um lado para o outro, de um vestido para outro; durante horas abandonam a sua cabeça oca aos artistas capilares que, a todo o custo, querem saciar a sua paixão pelos montões de postiços. Apertadas nos seus espartilhos, pouco à vontade nas suas botinas, decotadas de maneira a fazer corar um sapador, voltejam noites inteiras nos seus bailes de caridade para recolherem alguns soldos para os pobres. Santas almas!
Para desempenhar a sua dupla função social de não produtor e de superconsumidor, o burguês teve não só de violentar os seus gostos modestos, perder os seus hábitos de trabalho de há dois séculos e entregar-se a um luxo desenfreado, às indigestões trufadas e aos deboches sifilíticos, mas também teve de subtrair ao trabalho produtivo uma enorme massa de homens para conseguir ajudantes.
Eis alguns números que provam como é colossal essa diminuição de forças produtivas: de acordo com o recenseamento de 1861, a população de Inglaterra e do País de Gales compreendia 20066244 pessoas, das quais 9 776259 do sexo masculino e 10289965 do sexo feminino. Se deduzirmos os que são demasiado velhos ou demasiado novos para trabalhar, as mulheres, os adolescentes e as crianças improdutivas, em seguida as profissões ideológicas como por exemplo governantes, polícia, clero, magistratura, exército, prostituição, artes, ciências, etc., depois as pessoas exclusivamente ocupadas a comer o trabalho de outrem sob a forma de renda fundiária, de juros, de dividendos, etc., restam por alto oito milhões de indivíduos dos dois sexos e de todas as idades, incluindo os capitalistas que funcionam na produção, no comércio, na finança, etc. Nesses oito milhões contam-se:
Trabalhadores agrícolas (incluindo os pastores, os criados e criadas de lavoura que habitam na quinta) - 1098261
Operarios de fábricas de algodao, de lã, de câ nhamo, de linho, de seda, de malha - 642607
Operários de minas de carvao e de metal - 565 835
Operários metalúrgicos (alto-fornos, laminadores, etc.) - 396998
Classe doméstica - 1 208648
"Se somarmos o número dos trabalhadores têxteis ao dos das minas de carvão e de metal, obteremos o total de 1 208442; se somarmos os primeiros e os das fábricas metalúrgicas, temos um total de 1 039 605 pessoas; ou seja, de ambas as vezes um número inferior ao dos modernos escravos domésticos. Eis o magnífico resultado da exploração capitalista das máquinas." (3)
A toda esta classe doméstica, cuja grandeza indica o grau atingido pela civilização capitalista, tem de se acrescentar a numerosa classe dos infelizes exclusivamente dedicados à satisfação dos gostos dispendiosos e fúteis das classes ricas, lapidadores de diamantes, rendeiras, bordadoras, encadernadores de luxo, costureiras de luxo, decoradores das casas de recreio, etc. (4)
Uma vez acocorada na preguiça absoluta e desmoralizada pelo prazer forçado, a burguesia, apesar das dificuldades que teve nisso, adaptou-se ao seu novo estilo de vida. Encarou com horror qualquer alteração. A visão das miseráveis condições de existência aceites com resignação pela classe operária e a da degradação orgânica gerada pela paixão depravada pelo trabalho aumentava ainda mais a sua repulsa por qualquer imposição de trabalho e por qualquer restrição de prazeres.
Foi precisamente então que, sem ter em conta a desmoralização que a burguesia tinha imposto a si própria como um dever social, os proletários resolveram infligir o trabalho aos capitalistas. Ingénuos, tomaram a sério as teorias dos economistas e dos moralistas sobre o trabalho e maltrataram os rins para infligir a sua prática aos capitalistas. O proletariado arvorou a divisa: Quem não trabalha, não come; Lyon, em 1831, levantou-se pelo chumbo ou pelo trabalho, os federados de 1871 declararam o seu levantamento a revolução do trabalho.
A estes ímpetos de furor bárbaro, destrutivo de todo o prazer e de toda a preguiça burguesas, os capitalistas só podiam responder com uma repressão feroz, mas sabiam que, se tinham conseguido reprimir estas explosões revolucionárias, não tinham afogado no sangue dos seus gigantescos massacres a absurda idéia do proletariado de querer infligir o trabalho às classes ociosas e fartas, e foi para desviar essa infelicidade que se rodearam de pretorianos, de polícias, de magistrados, de carcereiros mantidos numa improdutividade laboriosa. Já não se podem ter ilusões sobre o caráter dos exércitos modernos, são mantidos em permanência apenas para reprimir "o inimigo interno"; e assim que os fortes de Paris e de Lyon não foram construídos para defender a cidade contra o estrangeiro, mas para o esmagar no caso de revolta. E se fosse preciso um exemplo sem réplica, citemos o exército da Bélgica, desse país de Cocagne do capitalismo; à sua neutralidade é garantida pelas potências européias e, no entanto, o seu exército é um dos mais fortes em proporção da população. Os gloriosos campos de batalha do bravo exército belga são as planícies do Borinage e de Charleroi, é no sangue dos mineiros e dos operários desarmados que os oficiais belgas ensangüentam as suas espadas e ganham os seus galões. As nações européias não tem exércitos nacionais, mas sim exércitos mercenários, que protegem os capitalistas contra o furor popular que os queria condenar a dez horas de mina ou de fábrica de fiação.
Portanto, ao apertar o cinto, a classe operária desenvolveu para além do normal o ventre da burguesia condenada ao superconsumo.
Para ser aliviada no seu penoso trabalho, a burguesia retirou da classe operária uma massa de homens muito superior à que continuava dedicada à produção útil e condenou-a, por seu turno, à improdutividade e ao superconsumo. Mas este rebanho de bocas inúteis, apesar da sua voracidade insaciável, não basta para consumir todas as mercadorias que os operários, embrutecidos pelo dogma do trabalho, produzem como maníacos, sem os quererem consumir e sem sequer pensarem se se encontrarão pessoas para os consumir.
Em presença desta dupla loucura dos trabalhadores, de se matarem de supertrabalho e de vegetarem na abstinência, o grande problema da produção capitalista já não é encontrar produtores e multiplicar as suas forças, mas descobrir consumidores, excitar os seus apetites e criar-lhes necessidades fictícias. Uma vez que os operários europeus, que tremem de frio e de fome, recusam usar os tecidos que eles próprios tecem, beber os vinhos que eles próprios colhem, os pobres fabricantes, como espertalhões, devem correr aos antípodas para procurar quem os usará e quem os beberá: são centenas de milhões e de biliões que a Europa exporta todos os anos para os quatro cantos do mundo, para populações que não têm nada que fazer com esses produtos (5) Mas os continentes explorados já não são suficientemente vastos, são necessários países virgens. Os fabricantes da Europa sonham noite e dia com a África, com o lago sariano, com o caminho de ferro do Sudão, seguem com ansiedade os progressos dos Livingstone dos Stanley, dos Du Chailiu, dos de Brazza; de boca aberta, escutam as histórias mirabolantes desses corajosos viajantes. Que maravilhas desconhecidas encerra o "continente negro"! Campos são plantados de dentes de elefantes, rios de óleo de coco arrastam no seu curso palhetas de ouro, milhões de cus negros, nus como o rosto de Dufaure ou de Girardin esperam pelos tecidos de algodão para aprenderem a decência, pelas garrafas de aguardente e pelas bíblias para conhecerem as virtudes da civilização.
Mas tudo é insuficiente: o burguês que se farta, a classe doméstica que ultrapassa a classe produtiva, as nações estrangeiras e bárbaras que se enchem de mercadorias européias; nada, nada pode conseguir dar vazão às montanhas de produtos que se amontoam maiores e mais altas do que as pirâmides do Egito: a produtividade dos operários europeus desafia todo o consumo, todo o desperdício. Os fabricantes, doidos, já não sabem que fazer, já não conseguem encontrar matéria-prima para satisfazer a paixão desordenada, depravada, que os seus operários têm pelo trabalho. Nos nossos distritos onde há lã, desfiam-se trapos manchados e meio podres, fazem-se com eles panos chamados de renascimento, que duram o mesmo que as promessas eleitorais; em Lyon, em vez de deixar à fibra sedosa a sua simplicidade e a sua flexibilidade natural, sobrecarregam-na de sais minerais que, ao acrescentarem-lhe peso, a tornam friável e de pouco uso. Todos os nossos produtos são adulterados para facilitar o seu escoamento e abreviar a sua existência. A nossa época será chamada a idade da falsificação, tal como as primeiras épocas da humanidade receberam os nomes de idade da pedra, idade de bronze, pelo caráter da sua produção. Os ignorantes acusam de fraude os nossos piedosos industriais, enquanto que na realidade o pensamento que os anima é o de fornecer trabalho aos operários, que não conseguem resignar-se a viver de braços cruzados. Estas falsificações, que têm como único móbil um sentimento humanitário, mas que rendem soberbos lucros aos fabricantes que as praticam, se são desastrosas para a qualidade das mercadorias, se são uma fonte inesgotável de desperdício de trabalho humano, provam a filantrópica habilidade dos burgueses e a horrível perversão dos operários que, para saciarem o seu vicio do trabalho, obrigam os industriais a abafar os gritos da sua consciência e até mesmo a violar as leis da honestidade comercial.
E, no entanto, apesar da superprodução de mercadorias, apesar das falsificações industriais, os operários atravancam o mercado em grandes grupos implorando: trabalho! trabalho! A sua superabundância devia obrigá-los a refrear a sua paixão; pelo contrário, ela leva-a ao paroxismo. Mal uma possibilidade de trabalho se apresenta, logo se atiram a ela; então são doze, catorze horas que reclamam para estarem fartos até à saciedade e no dia seguinte ei-los de novo na rua, sem mais nada para alimentarem o seu vicio. Todos os anos, em todas as indústrias, os despedimentos surgem com a regularidade das estações. Ao supertrabalho perigoso para o organismo sucede-se o repouso absoluto durante dois ou quatro meses; e, não havendo trabalho, não há a ração diária. Uma vez que o vício do trabalho está diabolicamente encavilhado no coração dos operários; uma vez que as suas exigências abafam todos os outros instintos da natureza; uma vez que a quantidade de trabalho exigida pela sociedade é forçosamente limitada pelo consumo e pela abundância de matéria-prima, por que razão devorar em seis meses o trabalho de todo o ano? Porque não distribuí-lo uniformemente por doze meses e forçar todos os operários a contentar-se com seis ou cinco horas por dia, durante o ano, em vez de apanhar indigestões de doze horas durante seis meses? Seguros da sua parte diária de trabalho, os operários já não se invejarão, já não se baterão para arrancarem mutuamente o trabalho das mãos e o pão da boca; então, não esgotados de corpo e de espírito, começarão a praticar as virtudes da preguiça.
Embrutecidos pelo seu vício, os operários não conseguiram elevar-se à inteligência deste fato segundo o qual, para ter trabalho para todos era preciso racioná-lo como à água num navio em perigo. No entanto, os industriais, em nome da exploração capitalista, já há muito que pediram um limite legal do dia de trabalho. Perante a Comissão de 1860 sobre o ensino profissional, um dos maiores manufatureiros da Alsácia, o Sr. Bourcart, de Guebwiller, declarava:
"O dia de trabalho de doze horas era excessivo e devia ser reduzido para onze e aos sábados devia-se suspender o trabalho às duas horas. Posso aconselhar a adoção desta medida embora pareça onerosa à primeira vista; experimentamo-la nos nossos estabelecimentos industriais há já quatro anos e demo-nos bem e a produção média, longe de diminuir, aumentou."
No seu estudo sobre as máquinas, o Sr. F. Passy cita a seguinte carta de um grande industrial belga, o Sr. M. Ottavaere:
"As nossas máquinas, embora sejam as mesmas que as das fábricas de fiação inglesas, não produzem o que deveriam produzir e o que produziriam essas mesmas máquinas em Inglaterra, embora as fábricas de fiação funcionem menos duas horas por dia. [...] Trabalhamos todos duas longas horas a mais, estou convencido de que, se trabalhássemos onze horas em vez de treze, teríamos a mesma produção e, por conseguinte, produziríamos mais economicamente. "
Por outro lado, o Sr. Leroy-Beaulieu afirma que "um grande manufatureiro belga observa muito bem que nas semanas em que calha um dia feriado a produção não é inferior às das semanas normais" (6).
Aquilo que o povo, logrado na sua ingenuidade pelos moralistas, nunca ousou, ousou-o um governo aristocrático. Desprezando as elevadas considerações morais e industriais dos economistas, que, como as aves de mau agoiro, cacarejavam que diminuir uma hora ao trabalho das fábricas era decretar a ruína da indústria inglesa, o governo de Inglaterra proibiu por lei, estritamente observada, trabalhar mais de dez horas por dia; e, depois disso tal como antes, a Inglaterra continua a ser a primeira nação industrial do mundo.
Eis a grande experiência inglesa, eis a experiência de alguns capitalistas inteligentes, ela demonstra irrefutavelmente que, para reforçar a produtividade humana, tem de se reduzir as horas de trabalho e multiplicar os dias de pagamento e os feriados, e o povo francês não está convencido. Mas se uma miserável redução de duas horas aumentou em dez anos a produção inglesa em cerca de um terço (7), que ritmo vertiginoso imprimiria à produção francesa uma redução geral de três horas no dia de trabalho? Os operários não conseguem compreender que, cansando-se excessivamente, esgotam as suas forças antes da idade de se tornarem incapazes para qualquer trabalho; que absorvidos, embrutecidos por um único vício, já não são homens, mas sim restos de homens; que matam neles todas as belas faculdades para só deixarem de pé, e luxuriante, a loucura furiosa do trabalho.
Ah! como papagaios de Arcádia repetem a lição dos economistas: "Trabalhemos, trabalhemos para aumentar a riqueza nacional." O idiotas! é porque trabalhais demais que a ferramenta industrial se desenvolve lentamente. Deixai de vociferar e escutai um economista; ele não é um águia, não é o Sr. L. Reybaud, que tivemos a felicidade de perder há alguns meses:
"De um modo geral, é na base das condições de mão-de-obra que se regula a revolução nos métodos de trabalho. Enquanto a mão-de-obra fornece os seus serviços a baixo preço, esbanjam-na; procuram poupá-la quando os seus serviços se tornam mais caros." (8)
Para forçar os capitalistas a aperfeiçoarem as suas máquinas de madeira e de ferro, é preciso elevar-se os salários e diminuir as horas de trabalho das máquinas de carne e osso. As provas? Podemos fornecê-las às centenas. Na fábrica de fiação, o tear mecânico (self acting mule) foi inventado e aplicado em Manchester, porque os fiandeiros se recusavam a trabalhar tanto tempo como antes.
Na América, a máquina invadiu todos os ramos da produção agrícola, desde o fabrico da manteiga até à sacha dos trigos: porquê? Porque o Americano, livre e preguiçoso, preferiria morrer mil vezes a ter a vida bovina do camponês francês. A lavra, tão penosa na nossa gloriosa França, tão rica de aguamentos, é, no Oeste americano, um agradável passatempo ao ar livre que se pratica sentado, fumando descuidadamente o seu cachimbo.
Se, diminuindo as horas de trabalho, se conquista para a produção social novas forças mecânicas, obrigando os operários a consumir os seus produtos, conquistar-se-á um enorme exército de forças de trabalho. A burguesia, liberta então da sua tarefa de consumidor universal, apressar-se-á a licenciar a barafunda de soldadas, de magistrados, de vigaristas, de proxenetas, etc., que retirou do trabalho útil para a auxiliar a consumir e a desperdiçar. É então que o mercado do trabalho ficará a transbordar, é então que será necessária uma lei de ferro para proibir o trabalho: será impossível encontrar trabalho para este bando de anteriores improdutivos, mais numerosos do que os piolhos da madeira. E a seguir a eles será necessário pensar em todos aqueles que proviam as suas necessidades e gostos fúteis e dispendiosos. Quando já não houver mais lacaios e generais a quem dar galões, mais prostitutas livres e casadas para cobrir de rendas, mais canhões para furar, mais palácios para construir, será necessário impor, através de leis severas, às operárias e aos operários de passamanaria, de rendas, de ferro, de construção civil, higiênicos passeios em escaler e os exercícios coreográficos para o restabelecimento da sua saúde e o aperfeiçoamento da sua raça. Desde que os produtos europeus consumidos no local não sejam transportados para o diabo, será preciso que os marinheiros, as tripulações, os camionistas se sentem e aprendam a passar o tempo na ociosidade. Os bem-aventurados Polinésios poderão então entregar-se ao amor livre sem recear os pontapés da Vênus civilizada e os sermões da moral européia.
Há mais. Para encontrar trabalho para todos os não valores da sociedade atual, para deixar a ferramenta industrial desenvolver-se indefinidamente, a classe operária deverá, tal como a burguesia, violentar os seus gostos abstinentes e desenvolver indefinidamente as suas capacidades consumidoras. Em vez de comer por dia uma ou duas onças de carne dura, quando a comer, comerá alegres bifes de uma ou duas libras; em vez de beber moderadamente mau vinho, mais papista que o papa, beberá grandes e profundos copázios de bordéus, de borgonha, sem batismo industrial, e deixará a água para os animais.
Os proletários meteram na cabeça infligir aos capitalistas dez horas de forja e de refinaria; eis o grande erro, a causa dos antagonismos sociais e das guerras civis. Será necessário não impor o trabalho mas proibi-lo. Será permitido aos Rothschild e aos Say provarem que foram durante toda a sua vida perfeitos velhacos; e se eles jurarem que querem continuar a viver como perfeitos velhacos, apesar do arrebatamento geral pelo trabalho, serão registados e, nas respectivas câmaras, receberão todas as manhãs uma moeda de vinte francos para os seus pequenos prazeres. As discórdias sociais desaparecerão. Os que vivem dos rendimentos, os capitalistas, serão os primeiros a unir-se ao partido popular, uma vez convencidos de que, longe de se lhes querer mal, se pretende pelo contrário livrá-los do trabalho de superconsumo e de desperdício pelo qual foram esmagados desde o seu nascimento. Quanto aos burgueses incapazes de provar os seus títulos de velhacos, deixá-los-ão seguir os seus instintos: existe um número suficiente de profissões nojentas para os colocar Dufaure limparia as latrinas públicas; Galliffet assassinaria os porcos sarnosos e os cavalos inchados; os membros da comissão das graças, enviados a Poissy (1), marcariam o bois e os carneiros para abater; os senadores, ligados às pompas fúnebres, farão de gatos-pingados. Para outros, encontrar-se-ão profissões à altura da sua inteligência. Lorgeril e Broglie rolharão as garrafas de champanhe, mas seriam amordaçados para não se embriagar; Ferry, Freycinet, Tirard, destruiriam os percevejos e os vermes dos ministérios e de outros albergues públicos No entanto, será necessário por os dinheiros públicos fora do alcance dos burgueses por se recear os hábitos adquiridos.
Mas tirar-se-á uma dura e longa vingança dos moralistas que perverteram a natureza humana, beatos falsos, santarrões, hipócritas "e outras seitas de pessoas como estas que se disfarçaram para enganar o mundo. Porque, dando a entender ao popular comum que não se ocuparam senão em contemplações e devoção, em jejuns e macerações da sensualidade, senão realmente para sustentar e alimentar a pequena fragilidade da sua humanidade: pelo contrário, zombam. E Deus sabe de que maneira! Et Curios simulant sed Bacchnalia vivunt (2). Podeis lê-lo em grandes letras e em iluminuras nos seus focinhos vermelhos e no seu ventre saliente, quando não se perfumam de enxofre" (3).
Nos dias de grandes festas populares, onde, em vez de comerem pó como nos 15 de Agosto e nos 14 de Julho dos burgueses, os comunistas e os coletivistas fizeram andar as garrafas e os presuntos e voar as taças, os membros da Academia das Ciências Morais e Políticas, os padres de vestes longas e curtas da igreja econômica, católica, protestante, judaica, positivista e livre pensadora, os propagadores do malthusianismo e da moral cristã, altruísta, independente ou submetida, vestidos de amarelo, segurarão na vela até se queimarem os dedos e viverão em fome junto das mulheres gaulesas e das mesas carregadas de carnes, de frutos e de flores e morrerão de sede juntos dos tonéis destapados. Quatro vezes por ano, quando as estações mudarem, tal como aos cães dos amoladores ambulantes, encerrá-los-ão nas grandes rodas e durante dez horas obrigá-los-ão a moer vento. Os advogados e os legistas sofrerão a mesma pena.
Num regime de preguiça, para matar o tempo que nos mata segundo a segundo, haverá sempre espetáculos e representações teatrais; é um trabalho adotado especialmente para os nossos burgueses legisladores. Organizá-los-emos em bandos que percorrem as feiras e as aldeias, dando representações legislativas. Os generais, com botas de montar, o peito agaloado de atacadores, de crachás, de cruzes da Legião de honra, irão pelas ruas e pelas praças, recrutando as boas pessoas. Gambetta e Cassagnac, seu compadre, farão a pantominice da porta. Cassagnac, em fato de gala de mata-mouros, revirando os olhos, torcendo o bigode, cuspindo a estopa inflamada, ameaçará todos com a pistola do pai e cairá num buraco mal lhe mostrem um retrato de Luílier; Gambetta discorrerá sobre a política externa, sobre a pequena Grécia que o endoutoriza e largará fogo à Europa para roubar a Turquia; sobre a grande Rússia que o estultifica com a compota que ela promete fazer com a Prússia e que deseja a oeste da Europa feridas e inchaços para enriquecer a leste e estrangular o niilismo no interior; sobre o Sr. Bismarck, que foi bastante bom para lhe permitir que se pronunciasse sobre a amnistia... depois, desnudando a sua vasta barriga pintada a três cores, tocará nela a chamada e enumerará os deliciosos animaizinhos, as verdelhas, as trufas, os copos de Margaux e de Yquem que tragou para encorajar a agricultura e manter alegres os eleitores de Belleville.
Na barraca, começar-se-á pela Farsa Eleitoral.
Diante dos eleitores com cabeças de madeira e orelhas de burro, os candidatos burgueses, vestidos como palhaços, dançarão a dança das liberdades políticas, limpando a face e o posfácio com os seus programas eleitorais de múltiplas promessas e falando com lágrimas nos olhos das misérias do povo e com voz de bronze das glórias da França; e as cabeças dos eleitores gritam em coro e solidamente: hi han! hi han!
Depois começará a grande peça: O Roubo dos Bens da Nação.
A França capitalista, enorme fêmea, de face peluda e de crânio calvo, deformada, com carnes flácidas, balofas, deslavadas, com olhos sem vida, ensonada e bocejando, está reclinada num canapé de veludo; a seus pés, o Capitalismo industrial, gigantesco organismo de ferro, com uma máscara simiesca, devora mecanicamente homens, mulheres, crianças, cujos gritos lúgubres e terríveis enchem o ar; a Banca com focinho de fuinha, com corpo de hiena e mãos de harpia, rouba-lhe habilmente do bolso as moedas de cem soldos. Hordas de miseráveis proletários descarnados, escoltados por gendarmes, de sabre desembainhado, expulsos pelas fúrias que os zurzem com os chicotes da fome, trazem para os pés da França capitalista montes de mercadorias, barricas de vinho, sacos de ouro e de trigo. Langlois, com os calções numa mão, o testamento de Proudhon na outra, o livro do orçamento entre os dentes, põe-se à frente dos defensores dos bens da nação e monta a guarda. Uma vez depostos os fardos, mandam expulsar os operários à coronhada e a golpes de baioneta e abrem a porta aos industriais, aos comerciantes e aos banqueiros.
De cambolhada, eles precipitam-se sobre o monte, tragando tecidos de algodão, sacos de trigo, lingotes de ouro, despejando pipas; sem poderem mais, sujos, nojentos, ficam prostrados nos seus excrementos e nos seus vômitos... Então ribomba o trovão, a terra agita-se e entreabre-se, surge a Fatalidade histórica; com o seu pé de ferro ela esmaga as cabeças daqueles que soluçam, cambaleiam, caem e já não podem fugir, e com a sua grande mão derruba a França capitalista, estupefacta e suando de medo.
Se, desenraizando do seu coração o vício que a domina e avilta a sua natureza, a classe operária se erguesse com a sua força terrível, não para reclamar os Direitos do Homem, que não são senão os direitos da exploração capitalista, não para reclamar o Direito ao Trabalho, que não é senão o direito à miséria, mas para forjar uma lei de bronze que proíba todos os homens de trabalhar mais de três horas por dia, a Terra, a velha Terra, tremendo de alegria, sentiria saltar nela um novo universo... Mas como pedir a um proletariado corrompido pela moral capitalista uma resolução viril?
Tal como Cristo, a triste personificação da escravatura antiga, os homens, as mulheres, as crianças do Proletariado sobem penosamente há um século o duro calvário da dor: desde há um século que o trabalho forçado quebra os seus ossos, magoa as suas carnes, dá cabo dos seus nervos; desde há um século que a fome torce as suas entranhas e alucina os seus cérebros!... Ó Preguiça, tem piedade da nossa longa miséria! Ó Preguiça, mãe das artes e das nobres virtudes, sê o bálsamo das angústias humanas!
Os nossos moralistas são pessoas muito modestas; se inventaram o dogma do trabalho, duvidam da sua eficácia para tranqüilizar a alma, regozijar o espírito e manter o bom funcionamento dos rins e outros órgãos; querem experimentar a sua utilização nos populares, in anima vili antes de o voltar contra os capitalistas, cujos vícios têm como missão desculpar e autorizar.
Mas, filósofos de quatro tostões a dúzia, porquê preocupardes-vos assim a elucubrar uma moral cuja prática não ousais aconselhar aos vossos senhores? O vosso dogma do trabalho, do qual vos mostrais tão orgulhosos, quereis vê-lo escarnecido, amaldiçoado? Abramos a história dos povos antigos e os escritos dos seus filósofos e dos seus legisladores.
"Não posso afirmar, diz o pai da história, Heródoto, que os Gregos receberam dos Egípcios o desprezo que têm pelo trabalho, porque encontro o mesmo desprezo estabelecido entre os Trácios, os Citas, os Persas e os Lídios; numa palavra, por que, na maior parte dos bárbaros, aqueles que aprendem as artes mecânicas e até mesmo os seus filhos são considerados como os últimos cidadãos.. - Todos os Gregos foram educados nestes princípios, especialmente os Lacedemónios." (1)
"Em Atenas, os cidadãos eram verdadeiros nobres que só se deviam ocupar da defesa e da administração da comunidade, como os guerreiros selvagens de onde tinham origem. Devendo, portanto, estar livres todo o tempo para velar, com a sua força intelectual e física, pelos interesses da República, encarregavam os escravos de todo o trabalho.
O mesmo sucedia com a Lacedemónia, onde até as mulheres não deviam nem fiar nem tecer para não se furtarem à sua nobreza." (2)
Os Romanos só conhecem duas profissões nobres e livres, a agricultura e as armas; todos os cidadãos viviam por direito à custa do Tesouro, sem poderem ser obrigados a prover à sua subsistência por nenhum dos sordidae artes (designavam assim os misteres) que pertenciam por direito aos escravos. Brutus, o Velho, para levantar o povo, acusou sobretudo Tarquínio, o tirano, de ter feito dos artesãos e dos pedreiros cidadãos livres (3).
Os filósofos antigos discutiam entre si sobre a origem das idéias, mas estavam de acordo se se tratava de abominar o trabalho.
"A natureza, diz Platão, na sua utopia social, na sua Republica modelo, a natureza não fez nem o sapateiro nem o ferreiro; essas ocupações degradam as pessoas que as exercem, vis mercenários, miseráveis sem nome que pelo seu próprio estado são excluídos dos direitos políticos. Quanto aos mercadores acostumados a mentir e a enganar, só serão suportados na cidade como um mal necessário. O cidadão que se tiver aviltado pelo comércio será perseguido por esse delito. Se se provar a acusação, será condenado a um ano de prisão. A punição será duplicada em cada reincidência." (4)
No seu Económico, Xenofonte escreve:
"As pessoas que se dedicam aos trabalhos manuais nunca são elevadas a altos cargos e é razoável. Condenadas na sua grande parte a estar sentadas todo o dia, algumas mesmo a suportar um fogo contínuo, não podem deixar de ter o corpo alterado e é muito difícil que o espírito não se ressinta disso. "
"Que pode sair de honroso de uma loja? - confessa Cícero - e o que é que o comércio pode produzir de honesto? Tudo o que se chama loja é indigno de um homem honesto [...] uma vez que os mercadores não podem ganhar sem mentir, e o que há de mais vergonhoso do que a mentira? Portanto, deve-se encarar como algo de baixo e de vil o mister de todos aqueles que vendem o seu esforço e a sua indústria, porque todo aquele que dá o seu trabalho por dinheiro vende-se a si mesmo e põe-se ao nível dos escravos." (5)
Proletários, embrutecidos pelo dogma do trabalho, compreendeis a linguagem destes filósofos, que escondem de vós com cioso cuidado: - Um cidadão que dá o seu trabalho em troca de dinheiro degrada-se ao nível dos escravos, comete um crime, que merece anos de prisão?
A hipocrisia cristã e o utilitarismo capitalista não tinham pervertido estes filósofos das Repúblicas antigas; dirigindo-se a homens livres, expunham ingenuamente o seu pensamento. Platão, Aristóteles, esses pensadores gigantes, cujos calcanhares os nossos Cousin, os nossos Caro, o nossos Simon só podem atingir pondo-se nas pontas dos pés, queriam que os cidadãos das suas Repúblicas ideais vivessem na maior ociosidade, porque, acrescentava Xenofonte, "o trabalho tira todo o tempo e com ele não há nenhum tempo livre para a República e para os amigos". Segundo Plutarco, o grande título de Licurgo, "o mais sábio dos homens" para admiração da posteridade, era ter concedido a ociosidade aos cidadãos da República proibindo-os de exercer qualquer mister (6) .
Mas, responderão os Bastiat, os Dupanloup, os Beaulieu e companhia da moral cristã e capitalista, esses pensadores, esses filósofos preconizavam a escravatura. - Perfeitamente, mas acaso podia ser de outro modo atendendo às condições econômicas e políticas da sua época? A guerra era o estado normal das sociedades antigas; o homem livre devia dedicar o seu tempo a discutir os assuntos de Estado e a velar pela sua defesa, os misteres eram então demasiado primitivos e demasiado grosseiros para que, ao praticá-los, se pudesse exercer a profissão de soldado e de cidadão; para possuírem guerreiros e cidadãos, os filósofos e os legisladores deviam tolerar os escravos nas Repúblicas heróicas. - Mas os moralistas e os economistas do capitalismo não preconizam o salariado, a escravatura moderna? E a que homens concede a escravatura capitalista a ociosidade? - Aos Rothschild, aos Schneider, às Sr.as Boucicaut, inúteis e prejudiciais, escravos dos seus vícios e dos seus criados.
"O preconceito da escravatura dominava o espírito de Pitágoras e de Aristóteles", escreveu-se desdenhosamente; e no entanto Aristóteles previa que "se cada utensílio pudesse executar sem intimação, ou então por si só, a sua função própria, tal como as obras-primas de Dédalo se moviam por si mesmas ou tal como os tripés de Vulcano que se punham espontaneamente ao seu trabalho sagrado; se, por exemplo, as lançadeiras dos tecelões tecessem por si próprias, o chefe de oficina já não teria necessidade de ajudantes, nem o senhor de escravos".
O sonho de Aristóteles é a nossa realidade. As nossas máquinas a vapor, com membros de aço, infatigáveis, de maravilhosa e inesgotável fecundidade, realizam por si próprias docilmente o seu trabalho sagrado; e, no entanto, o gênio dos grandes filósofos do capitalismo continua a ser dominado pelo preconceito do salariado, a pior das escravaturas. Ainda não compreendem que a máquina é o redentor da humanidade, o Deus que resgatará o homem das sórdidas artes e do trabalho assalariado, o Deus que lhe dará tempos livres e a liberdade.
Notas do Capitulo 3:
(1) No Antigo Regime, as leis da Igreja garantiam ao trabalhador 90 dias de descanso (52 domingos e 38 dias feriados) durante os quais era estritamente proibido trabalhar. Era o grande crime do catolicismo, a causa principal da irreligião da burguesia industrial e comercial. Na Revolução, mal esta foi senhora da situação, aboliu os dias feriados e substituiu a semana de sete dias pela de dez. Libertou os operários do jugo da Igreja para melhor os submeter ao jugo do trabalho. O ódio pelos dias feriados só aparece quando a moderna burguesia industrial e comerciante ganha corpo, entre os séculos XV e XVI. Henrique IV pediu a sua redução ao Papa; este recusou, porque "uma das heresias que correm atualmente diz respeito às festas" (carta do cardeal d'Ossat). Mas, em 1666, Perefixe, arcebispo de Paris suprimiu 17 na sua diocese. O protestantismo, que era a religião cristã adaptada às novas necessidades industriais e comerciais da burguesia, preocupou-se menos com o descanso popular; destronou no céu os santos para abolir na terra as suas festas. A reforma religiosa e o livre pensamento filosófico não eram senão pretextos que permitiram à burguesia jesuíta e voraz escamotear os dias de festa do popular. (retornar ao texto)
(2) Estas festas pantagruélicas duravam semanas. Don Rodrigo de Lara ganha a sua noiva expulsando os Mouros de Calatrava-a-velha e o Romancero narra que:
Las bodas fueron en Burgos,
Las tornabodas en Salas:
En bodas y tornabodas
Passaron siete semanas
Tantas vienen de las gentes,
Que no caben por las plazas...
(As bodas foram em Burgos, o regresso das bodas em Salas; em bodas e regresso de bodas passaram sete semanas; acorrem tantas pessoas que não cabem nas praças...) Os homens destas bodas de sete semanas eram os heróicos soldados das guerras da independência. (retornar ao texto)
(3) Karl Marx, O Capital, t. III. (retornar ao texto)
(4) "A proporção segundo a qual a população de um pais é empregada como doméstica, ao serviço das classes abastadas, indica o seu progresso em riqueza nacional e em civilização.)" (R. M. Martin, Ireland before and after the Union, 1818.) Gambetta, que negava a questão social, depois de já não ser advogado pobre do Café Procope, queria certamente referir-se a essa classe doméstica sempre crescente quando ele reclamava o advento das novas camadas sociais. (retornar ao texto)
(5) Dois exemplos: o governo inglês, para agradar aos países indianos que, apesar das fomes periódicas que desolam o país, teimam em cultivar a dormideira em vez de arroz ou de trigo, viu-se obrigado a empreender guerras sangrentas para impor ao governo chinês a livre introdução do ópio indiano. Os selvagens da Polinésia, apesar da mortalidade que daí adveio, viram-se obrigados a vestirem-se e a embriagarem-se à inglesa para consumirem os produtos das destilarias da Escócia e das tecelagens de Manchester. (retornar ao texto)
(6) Paul Leroy-Beaulieu, La Question Ouvriere au XIV siecle, 1872.(retornar ao texto)
(7) Eis, segundo o célebre estatístico R. Giffen, do Departamento
de Estatística de Londres, a progressão crescente da riqueza
nacional da Inglaterra e da Irlanda em:
1814 - ela era de 55 mil milhões de francos
1865- 162,5 mil milhões de francos
1875- 212,5 mil milhões de francos (retornar
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(8) Louis Reybaud, Le Coton, son Régime, ses Problêmes, 1863. (retornar ao texto)
Notas do Capitulo 4:
(1) Poissy: Prisão Central.(retornar ao texto)
(2) Simulam ser Curius e vivem como nas Bacanais (Juvenal).(retornar ao texto)
(3) Pantagruel, t. II, Cap. LXXIV.(retornar ao texto)
Notas do Apêndice:
(1) Heródoto, t. II, trad. Larcher, 1876.(retornar ao texto)
(2) Biot, De l'Abolition de l'Esclavage Ancien en Occident, 1840.(retornar ao texto)
(3) Tito Lívio, L. 1.(retornar ao texto)
(4) Platão, Repúblicas, 1. V.(retornar ao texto)
(5) Cícero, Des Devoirs, 1, tít. II, cap. XLII.(retornar ao texto)
(6) Platão, República, V e As Leis, III; Aristóteles, Política, II e VII; Xenofontes, Económico, IV e VI; Plutarco, Vida de Licurgo.(retornar ao texto)
Inclusão | 28/06/2003 |
Última alteração | 12/08/2014 |